Revista Portuguesa de Investigação Comportamental e Social 2022 Vol. 8 (1): 1-17
Portuguese Journal of Behavioral and Social Research 2022 Vol. 8 (1): 1-17
Departamento de Investigação & Desenvolvimento • Instituto Superior Miguel Torga


ARTIGO ORIGINAL

Validação da versão portuguesa da Social-Emotional Expertise Scale

Validation of the Portuguese version of the Social-Emotional Expertise Scale

Ana Beatriz Santos 1*

Marina Cunha 1.2*

Mariana Novo 1

Ilda Massano-Cardoso 1.3

Ana Galhardo 1.2

(1) Instituto Superior Miguel Torga (ISMT), Coimbra, Portugal
(2) Faculdade de Psicologia e de Ciências da Educação da Universidade de Coimbra, Centro de Investigação em Neuropsicologia e Intervenção Cognitivo-Comportamental (CINEICC), Coimbra, Portugal
(3) Faculdade de Medicina da Universidade de Coimbra, Coimbra, Portugal; Faculdade de Economia da Universidade de Coimbra, Centro de Estudos e Investigação em Saúde da Universidade de Coimbra (CEISUC), Coimbra, Portugal
* As duas primeiras autoras deram igual contributo na elaboração do presente manuscrito, pelo que concordam que ambas sejam designadas como primeiras autoras do artigo.


Recebido: 05/02/2022; Revisto: 26/04/2022; Aceite: 16/05/2022.


https://doi.org/10.31211/rpics.2022.8.1.245


Resumo

Objetivo: Para fazer face à necessidade de novos instrumentos de avaliação de competências socioemocionais validados para a população portuguesa, o presente estudo teve como objetivo traduzir e validar a escala Social-Emotional Expertise (SEE). Foram analisadas a estrutura fatorial da SEE, fidedignidade, estabilidade temporal e a associação com outras variáveis teoricamente relevantes. Métodos: Duas amostras independentes de participantes (N = 466), entre os 18 e os 64 anos (27,33 ± 11,52) foram utilizadas para validar a SEE. Na Amostra 1 (n = 258) foi analisada a estrutura fatorial da SEE, as propriedades psicométricas e a sua associação com outros construtos. Na Amostra 2 (n = 208) foi testada a plausibilidade do modelo hierárquico da escala representado por uma pontuação global com dois fatores. Os participantes preencheram um protocolo de questionários de autorresposta que avaliaram as competências socioemocionais, a inteligência emocional, a felicidade subjetiva e a ansiedade de interação social. Resultados: A SEE apresentou uma estrutura bifatorial composta pelos fatores Adaptabilidade e Expressividade. A análise fatorial confirmatória do modelo hierárquico de segunda ordem indicou um ajustamento sofrível. A SEE revelou uma boa consistência interna para o total e respetivos fatores e uma adequada fidedignidade teste-reteste. As competências socioemocionais (SEE) revelaram correlações positivas com a inteligência emocional e com a felicidade subjetiva, e associações negativas com a ansiedade de interação social. Não foram encontradas diferenças significativas entre os sexos, e a idade e escolaridade não se mostraram associadas às competências socioemocionais avaliadas pela SEE. Conclusões: A escala Social-Emotional Expertise mostrou ser um instrumento válido e fidedigno para avaliar as competências socioemocionais em adultos na população Portuguesa, sendo de utilidade para a investigação e práticas de intervenção no contexto educativo e clínico.

Palavras-Chave: Análise fatorial; Avaliação; Competências Socioemocionais; Instrumentos de autorresposta; Validação.


Abstract

Objective: Given the relevance of new instruments for assessing socio-emotional skills validated for the Portuguese population, the present study aimed to translate and validate the Social-Emotional Expertise (SEE) scale. The factor structure of the SEE, reliability, test-retest reliability and the association with other theoretically relevant variables were analyzed. Methods: Participants completed a set of self-report measures assessing social-emotional skills, emotional intelligence, subjective happiness, and social interaction anxiety. The SEE validation study was conducted on two independent samples (N = 466) aged between 18–64 (27.33 ± 11.52). The SEE factor structure, reliability, and validity were analyzed in Sample 1 (n = 258). Additionally, the plausibility of the hierarchical scale model represented by a global score with two second-order factors was tested in Sample 2 (n = 208). Results: The SEE showed a two-factor structure: (1) Adaptability and (2) Expressiveness factors. Confirmatory factor analysis of the second-order hierarchical model revealed a poor fit to the data. The SEE showed good reliability for the total score and factors and adequate test-retest reliability. As measured by the SEE, social-emotional skills revealed positive correlations with emotional intelligence and subjective happiness and negative an association with social interaction anxiety. No significant gender differences were found, and age and years of education were not significantly associated with socio-emotional skills, as assessed by the SEE. Conclusions: The Social-Emotional Expertise scale proved to be a valid and reliable instrument to assess socio-emotional skills in adults in the Portuguese population, being useful for research and intervention practices in the educational and clinical context.

Keywords: Assessment; Factor Analysis; Self-report Instrument; Socioemotional skills; Validation.

Introdução

O dispor de competências cognitivas e socioemocionais tem-se mostrado um fator fulcral no que refere ao processo evolutivo do ser humano ( Heckman et al., 2006). Desenvolver competências é considerado um procedimento de aprendizagem a longo prazo, tendo como objetivo que o indivíduo adquira capacidades, conhecimentos, habilidades, valores e atitudes. Esta aprendizagem irá permitir que o individuo aprimore o seu empowerment e fortaleça a sua autonomia, dando-lhe ferramentas para defrontar eventuais desafios pessoais e/ou profissionais (Ashraf et al., 2020; Marinho-Araujo & Almeida, 2016). Segundo Santos e Primi (2014), as competências classificam-se em duas vertentes; as que fazem referência às capacidades e conhecimentos académicos, denominadas competências cognitivas, e as desenvolvidas através de experiências sociais e afetivas, nomeadas de competências socioemocionais ( Weissberg et al., 2015). As competências cognitivas desenvolvem-se, tipicamente, no âmbito escolar, sendo proporcionadas pelos agentes dos sistemas educativos que, em articulação com o núcleo familiar e comunitário, potencializam em simultâneo, não só estas competências, mas também as socioafetivas, através da aprendizagem socioemocional (Weissberg et al., 2015).

No que refere às competências socioemocionais, também denominadas competências não cognitivas, estas articulam-se com uma ampla gama de características pessoais do indivíduo (personalidade, motivação, valores e interesses), que não podem ser medidas pelos mesmos testes ou escalas que as competências cognitivas. As competências socioemocionais tendem a manifestar-se através de padrões de comportamentos, cognições e afetos relativamente consistentes, que podem ser moldados ao longo do desenvolvimento do indivíduo, por meio da aprendizagem e da socialização, tendo em consideração que a atuação genética (heritabilidade) exerce uma forte influência (Kandler & Zapko-Willmes, 2017; Lechner et al., 2019). Estas competências são, pois, o resultado da interação entre competências sociais e competências emocionais que integram, interdependentemente, o processo evolutivo do ser humano (Heckman et al., 2013; Mitchell et al., 2020). A aquisição de competências sociais irá permitir que o indivíduo consiga ter uma vida social ativa, estabelecendo relações interpessoais com sucesso. Inversamente, a ausência ou um fraco desenvolvimento de competências socioemocionais, em etapas mais precoces da vida, poderá vir a comprometer a evolução para as seguintes fases, onde o indivíduo poderá vir a manifestar comportamentos antissociais, embora os mesmos não dependam exclusivamente da carência destas competências (Heckman et al., 2013; Morgado & Dias, 2016). Por sua vez, em relação às competências emocionais, estas desempenham um papel relevante na forma como o indivíduo lida com a frustração, na automotivação, assim como, no modo como gere sentimentos de raiva e fomenta a empatia, que irão ajudá-lo em momentos de adversidade ( Pérez & Filella, 2019).

Na última década, a investigação sobre as competências socioemocionais na área educacional tem aumentado substancialmente ( Lechner et al., 2019). De modo consistente, diversos estudos têm salientado a necessidade da inclusão das competências socioemocionais nos sistemas educativos do indivíduo, seja em contexto escolar, comunitário ou familiar, reconhecendo que esta base poderá proporcionar um maior sucesso académico e um bom desenvolvimento social, reduzindo possíveis comportamentos problemáticos (Abed, 2016;Ashraf et al., 2020;Morgado & Dias, 2016;Pérez & Filella, 2019;Rodrigues et al., 2020; Taylor et al., 2017). A importância das competências socioemocionais também se reflete no contexto organizacional quando o indivíduo atinge a fase adulta. A presença ou a ausência destas competências nas fases mais avançadas da vida, poderá determinar o sucesso ou o fracasso laboral, condicionando o bem-estar de vida geral do sujeito. Alguns estudos sugerem que as competências socioemocionais dos indivíduos estão associadas a uma melhor integração e ajustamento na função laboral, facilitando a estabilidade e produtividade no trabalho (Lindqvist & Westman, 2011; Thiel & Thomsen, 2013).

Em síntese, o desenvolvimento de competências socioemocionais tem sido considerado por educadores, psicólogos e economistas um fator relevante para a promoção e manutenção da saúde mental, associado intrinsecamente ao sucesso individual, social e laboral do indivíduo (Mitchell et al., 2020;Salmela-Aro & Upadyaya, 2020; Santos & Primi, 2014). Segundo Mahoney e Weissberg (2019), a aprendizagem socioemocional tem vindo a revelar-se um fenómeno fulcral a nível mundial. Diversos países (e.g., Estados Unidos da América, Reino Unido, Irlanda do Norte, Austrália, Suécia), têm vindo a criar programas que visam promover esta aprendizagem nas escolas, desde o ensino pré-escolar até ao ensino superior, salientando a sua relevância no desenvolvimento de todos os cidadãos (Humphrey, 2013; Weissberg et al., 2015). Também em Portugal se confirma esta tendência (Coelho et al., 2016).

O desenvolvimento de programas de intervenção de competências socioemocionais tem chamado a atenção para a necessidade de uma avaliação fina e rigorosa destas competências. De facto, a investigação das competências socioemocionais não se tem revelado uma tarefa fácil, evidenciada pelas inúmeras dificuldades relativas à terminologia e avaliação das mesmas.

Em Portugal, Coelho e Sousa (2020) evidenciaram uma lacuna no desenvolvimento de instrumentos de avaliação das competências socioemocionais, apontando para a pertinência de mais instrumentos validados para a população portuguesa. O Questionário de Avaliação de Competências Sociais e Emocionais (QACSE), validado para crianças dos 9 aos 12 anos (Coelho & Sousa, 2020), e dos 12 aos 16 (Coelho et al., 2015), assim como a versão para professores (QACSE-P) (Coelho et al., 2014), são instrumentos que avaliam competências e dificuldades socioemocionais. De outro modo, o Social Skills Rating System (SSRS) direcionado para pais, alunos e professores ( Lemos & Meneses, 2002) é um instrumento que visa avaliar as competências sociais, baseando-se numa perspetiva multidimensional. Estes são alguns exemplos de instrumentos validados para a população portuguesa.

A Social-Emotional Expertise (SEE), desenvolvida por McBrien et al. (2018), é uma escala que avalia comportamentos e cognições pró-sociais relacionadas com a qualidade das interações sociais. Neste modelo teórico, o construto de competência socioemocional representa uma síntese de aptidões cognitivas específicas, como a inteligência social e a inteligência emocional, enfatizando igualmente o timing e a sincronia de comportamentos relevantes para a capacidade socioemocional geral. Assim, este construto de expertise socioemocional integra atributos individuais e aspetos únicos de interações na compreensão da variabilidade da qualidade na dinâmica relacional. Esta escala, inicialmente constituída por 76 itens, resultou numa versão final de 25 itens, evidenciando dois fatores (Adaptabilidade e Expressividade). O fator Adaptabilidade inclui itens relacionados com a adequação do comportamento do indivíduo às dinâmicas sociais específicas, facilitando a adaptação rápida do indivíduo a uma variedade de relações sociais e emocionais. O fator “Expressividade” visa avaliar as capacidades que o indivíduo dispõe para expor as suas emoções perante os outros (McBrien et al., 2018 ). O mesmo é dizer que os itens do primeiro fator descrevem a capacidade de o indivíduo se orientar de forma bem-sucedida em ambientes sociais, enquanto os itens do segundo fator se referem à capacidade de transmitir adequadamente ideias e sentimentos aos outros. Ambos os fatores mostraram-se positivamente associados às avaliações de juízes sobre a qualidade geral da interação. Esta escala inovadora evidenciou uma excelente consistência interna e uma boa fidedignidade temporal ( McBrien et al., 2018). Apesar da semelhança entre os construtos de competência socioemocional e inteligência emocional, a análise fatorial exploratória do conjunto dos itens que integram estas duas medidas mostrou que os itens saturaram em fatores distintos, sugerindo que a SEE não corresponde a um subcomponente da inteligência emocional. A SEE evidenciou também uma validade convergente e descriminante adequada ( McBrien et al., 2018). Em síntese, a SEE distingue-se dos outros instrumentos existentes (e.g., QACSE-P e SSRS), pelo fato de se focar sobre os comportamentos reais que facilitam as interações sociais e a transmissão de pistas socialmente significativas. Ou seja, para além da avaliação das competências cognitivas específicas relacionadas com as interações sociais, a SEE acrescenta o contributo do timing e sincronia dos comportamentos para a competência socioemocional global.

Tendo em conta o presente contexto, caraterizado por uma escassez de instrumentos de avaliação das competências socioemocionais para a população portuguesa, o presente estudo teve como objetivo central traduzir e validar a escala Social Emotional Expertise destinada à população adulta. Seguindo as recomendações de Cronbach e Meehl ( 1955), foi analisada, num primeiro momento, a estrutura fatorial da escala e a sua fidedignidade e estabilidade temporal. Posteriormente, foi avaliada a validade convergente e divergente da SEE, relacionando-a com outros construtos (inteligência emocional (SEIS), felicidade subjetiva (SHS) e ansiedade de interação social (SIAS). Adicionalmente, foram explorados os valores médios da SEE em função do sexo e associações com a idade e escolaridade.

Método

Participantes

Participaram duas amostras distintas neste estudo. A Amostra 1 constituída por 258 participantes, 48 do sexo masculino (18,6%) e 210 do sexo feminino (81,4%), foi utilizada para a análise exploratória da estrutura fatorial da escala e das suas caraterísticas psicométricas. Estes participantes apresentaram idades compreendidas entre os 18 e os 64 anos (M =28,05; DP = 11,29). A escolaridade variou entre o terceiro ano do ensino básico, e grau de doutoramento (M = 12,98; DP = 3,05).

A análise Fatorial Confirmatória foi realizada numa amostra independente (Amostra 2), constituída por 208 participantes, 54 (26,0%) do sexo masculino e 154 (74,0%) do sexo feminino, com idades compreendidas entre os 18 e os 59 anos (M = 26,44; DP = 9,42). A escolaridade variou entre o quarto ano do ensino básico e o grau de doutoramento (M = 14,55; DP = 2,70). Comparando as duas amostras, os participantes não se distinguiram significativamente na distribuição por sexo (χ2 = 3,65; p = 0,057), nem relativamente à média de idade (t(464) = 1,65;p =0,101). As duas amostras diferiam nos anos de escolaridade ( t(464) = -5,90; p < 0,001), apresentando os participantes da Amostra 2, mais anos de escolaridade (14,55 ± 2,70), comparativamente aos indivíduos da Amostra 1 (12,98 ± 3,05).

Para avaliar a fidedignidade teste-reteste, um subgrupo da Amostra 1 aceitou completar a SEE pela segunda vez, com quatro semanas de intervalo. Um total de 58 participantes com uma média de idade de 25,47 (DP = 9,50) participaram neste estudo.

Instrumentos

O protocolo de avaliação incluiu a recolha de dados sociodemográficos (sexo, idade e escolaridade) dos participantes e o preenchimento de quatro escalas de autorresposta.

Social-Emotional Expertise (SEE)

A SEE (McBrien et al., 2018) é composta por 25 itens distribuídos por dois fatores que visam avaliar as competências socioemocionais. Para além da pontuação global, é possível obter pontuações relativas ao fator Adaptabilidade (e.g., “Nas interações sociais, as minhas expressões faciais estão perfeitamente sincronizadas”) e ao fator Expressividade (e.g., “Uso a minha voz para mostrar as minhas emoções”). Todos os itens são respondidos numa escala do tipo Likert de cinco pontos, de nunca (1), neutro (3) a sempre (5). Não existem itens invertidos, o que indica que quanto mais elevada é a pontuação, maior é a competência socioemocional do indivíduo. A versão original apresenta um alfa de Cronbach de 0,92, de 0,91 e de 0,82 para a pontuação global e fatores Adaptabilidade e Expressividade, respetivamente (McBrien et al., 2018), indicando, assim, uma boa consistência interna.

Schutte Emotional Intelligence Scale (SEIS)

A SEIS (Schutte et al., 1998), na sua versão portuguesa (Vicente, 2014), é constituída por 27 itens que visam avaliar a inteligência emocional definida como a capacidade de o indivíduo identificar e regular as emoções em si mesmo e nos outros. Os itens são respondidos segundo uma escala de Likert de cinco pontos que varia entre discordo totalmente (1) e discordo totalmente (5). A pontuação global pode oscilar entre os 27 e 135 pontos, correspondendo valores mais elevados a graus mais elevados de inteligência emocional. Esta escala apresentou um alfa de Cronbach para a pontuação global de 0,89 ( Vicente, 2014). A versão inglesa original apresentou uma boa consistência interna, com um alfa de Cronbach de 0,90 para a pontuação global (Schutte et al., 1998). No presente estudo, foi utilizado o total da escala que evidenciou um alfa de Cronbach de 0,90, mostrando uma boa consistência interna.

Subjective Happiness Scale (SHS)

A SHS (Lyubomirsky & Lepper, 1999; Pais-Ribeiro, 2012) é um instrumento que visa avaliar o grau de felicidade com a vida no geral. É composta por quatro afirmações, em que duas visam a caracterização do próprio por comparação aos seus pares (e.g., “Comparativamente com as outras pessoas como eu, considero-me…”), e outras duas visam identificar a felicidade ou infelicidade do indivíduo (e.g., “Em geral, considero-me…”). A escala é do tipo análoga visual com sete posições ancoradas em duas afirmações antagónicas, que pretendem expressar o grau de felicidade ou a ausência da mesma. A pontuação pode variar entre 4 e 28 pontos, sendo que quanto maior for a pontuação, maior o grau de felicidade do indivíduo. A versão original apresentou um alfa de Cronbach de 0,76 ( Lyubomirsky & Lepper, 1999) e a versão portuguesa um alfa de Cronbach de 0,86 ( Pais-Ribeiro, 2012). No presente estudo, o total da escala evidenciou um alfa de Cronbach de 0,75, indicador de uma consistência interna razoável.

Social Interaction Anxiety Scale (SIAS)

A SIAS (Mattick & Clarke, 1998; Pinto-Gouveia & Salvador, 2001) é um instrumento que avalia a ansiedade de interação social (e.g., “Ao misturar-me socialmente sinto-me desconfortável”). É composta por dezanove itens respondidos com uma escala de Likert de quatro pontos denão é nada característico da minha maneira de ser (0) a é extremamente característico da minha maneira de ser (4). A pontuação pode variar entre 0 e 76, significando valores mais elevados, maior ansiedade de interação social. A versão inglesa original ( Mattick & Clarke, 1998) e a versão portuguesa ( Pinto-Gouveia & Salvador, 2001) apresentaram um alfa de Cronbach de 0,90, indicando uma boa consistência interna. No presente estudo o total da escala evidenciou um alfa de Cronbach de 0,93.

Procedimentos

Num primeiro momento foram requisitadas as autorizações para o uso dos instrumentos aos respetivos autores, via correio eletrónico. No caso da escala SEE, foi adquirida a autorização para se proceder à tradução do instrumento para a língua portuguesa. A equivalência semântica e de conteúdo, necessária para investigações interculturais, foi assegurada pelo método de tradução e retroversão (Erkut, 2010), aplicado por duas investigadoras da área da psicologia e por um falante nativo de inglês, fluente em português e professor de inglês. Após ligeiros ajustes resultantes deste processo, foi realizado um teste piloto com 11 elementos para verificar a clareza ou compreensibilidade dos itens. Este processo obedeceu às recomendações de Hambleton, et al. (2005) e da International Test Commission ( 2017). Não tendo surgido qualquer comentário ou dúvida, chegou-se a uma versão final que integrou o protocolo de investigação, juntamente com outros instrumentos de avaliação.

O presente estudo foi submetido à Comissão de Ética do Instituto Superior Miguel Torga, tendo obtido o seu parecer favorável (CE-P06-21).

A recolha de dados foi feita através de uma plataforma online (Google Forms) onde foi disponibilizada informação essencial sobre a investigação, incluindo os objetivos do estudo, critérios de inclusão dos participantes, procedimentos éticos e consentimento informado. O link para aceder a esta plataforma online, foi disponibilizado através das redes sociais, onde participantes preencheram o protocolo constituído por um questionário sociodemográfico e quatro questionários de autorresposta. A participação foi anónima, voluntária, seguindo os preceitos éticos e deontológicos da Declaração de Helsínquia. Foram ainda convidados a participar no estudo de reteste da SEE, o qual consistia no preenchimento deste questionário uma segunda vez (com um intervalo de quatro semanas), solicitando, para esse efeito, a indicação do email.

Análise Estatística

Para a análise descritiva e psicométrica dos dados utilizou-se o software Statistical Package for the Social Sciences (IBM SPSS Statistics, versão 26). Na análise estatística, recorreu-se aos testes paramétricos, justificados pelo tamanho da amostra (N = 258) e pela exploração das variáveis que sugeriram uma distribuição normal. A distribuição das variáveis foi analisada através do teste Kolmogorov-Smirnov e dos valores de Skewness e Kurtosis, não evidenciando enviesamentos graves à normalidade (|Sk| < 3 e |Ku| < 10; Kline, 2005). Os procedimentos estatísticos utilizados para a validação da versão portuguesa da SEE, foram os mesmos utilizados pelos autores da versão original.

A estrutura interna da SEE foi examinada através de uma Análise Fatorial Exploratória (AFE) que permite descobrir estatisticamente as estruturas e os fatores latentes subjacentes, ou seja, identificar fatores com base apenas na variação comum. A factoração do eixo principal (FEP) foi usada para identificar fatores latentes, usando rotação oblíqua (Promax), o que permite que os fatores sejam correlacionados. Os critérios utilizados na retenção de fatores são explicitados na descrição da respetiva análise.

Para confirmar o modelo teórico de dois fatores incluídos numa pontuação global, procedeu-se a uma Análise Fatorial Confirmatória hierárquica de segunda ordem, numa amostra independente (n = 208), com recurso ao software IBM SPSS AMOS (versão 25). Foi aplicada a estimativa de máxima verossimilhança, que é robusta contra os desvios da normalidade multivariada. A qualidade de ajustamento do modelo foi avaliada tendo em conta os seguintes indicadores: qui-quadrado (χ2/gl),Comparative Fit Index (CFI),Goodness of Fit Index (GFI),Tucker & Lewis Index (TLI)Root Mean Square Error of Approximation (RMSEA) e Standardised Root Mean Square Residual (SRMR). O ajustamento local dos itens foi analisado por meio de pesos de regressão padronizados e correlações múltiplas quadradas (Kline, 2005; Tabachnick & Fidell, 2007). A existência de observações outliers foi analisada através do quadrado das distâncias de Mahalanobis (DM2).

Na análise das caraterísticas dos itens da SEE, foram calculadas as respetivas médias, desvios-padrão, correlação item-total e o coeficiente alfa de Cronbach no caso de o item ser removido. Para além da determinação do alfa de Cronbach, a fidedignidade foi também confirmada pelo cálculo da fiabilidade compósita (FC).

O teste t de Student para amostras independentes foi utilizado para a comparação dos valores médios obtidos nos instrumentos de avaliação, em função do sexo.

Para analisar as associações entre a pontuação total da SEE e outros instrumentos que avaliam construtos teoricamente relacionados, utilizou-se o coeficiente de correlação r de Pearson, tendo sido este também utilizado, para a realização do cálculo teste-reteste da SEE com intervalo de quatro semanas. Foi utilizada a tipologia de Pestana e Gageiro ( 2014) que considera uma correlação baixa se o resultado oscilar de 0,20 a 0,39; uma correlação moderada se oscilar de 0,40 a 0,69; uma correlação alta se oscilar entre 0,70 e 0,89; e uma correlação muito alta se for igual ou superior a 0,90. O coeficiente de correlação intraclasse (CCI) foi também utilizado para estimar a estabilidade do total da escala no referido intervalo de tempo. Segundo Koo e Li (2016), valores menores que 0,5 sugerem uma concordância/estabilidade pobre, entre 0,5 e 0,75 uma estabilidade moderada, valores entre 0,75 e 0,9 são considerados bons e maiores que 0,9 apontados como excelentes.

Resultados

Análise da estrutura fatorial

Na AFE da SEE, para averiguar o número de fatores estatisticamente significativos, foram considerados os seguintes critérios: (a) a interpretabilidade de cada solução, (b) fatores com autovalores maiores que 1, e (c) cargas fatoriais maiores ou iguais a 0,35. Adicionalmente, o número de fatores a reter foi ainda confirmado pelo teste de Scree Plot e pela Análise Paralela, uma vez que o critério de valores próprios maiores do que 1 pode produzir fatores espúrios ( Velicer & Jackson, 1990). Todos os itens evidenciaram uma correlação adequada (> 0,40) com a pontuação total da Escala SEE (Tabela 1). A análise revelou cinco fatores com autovalores maiores que 1,00. O autovalor do primeiro fator foi de 9,27, enquanto os fatores restantes tiveram autovalores mais baixos (1,76; 1,32; 1,25 e 1,05). O teste de Scree plot sugeriu a retenção de dois fatores. A análise paralela indicou a possibilidade de cinco fatores, tendo apenas dois autovalores superiores a 1 (8,78 e 1,28). Com base nos dados indicados e sua interpretação foram retidos dois fatores (Tabela 1).

Tabela 1

Pesos Fatoriais e Comunalidades (h2) da AFE e Estatísticas de Confiabilidade dos Itens da SEE

Item

Fator Adaptabilidade

Fator Expressividade

h 2

M (DP)

Correlação item total corrigida

Alfa de Cronbach se item eliminado

Item 7

0,76

0,40

4,03 (0,97)

0,47

0,93

Item 6

0,75

0,50

3,42 (0,96)

0,54

0,92

Item 9

0,70

0,58

3,78 (0,93)

0,69

0,92

Item 5

0,69

0,54

3,50 (1,04)

0,56

0,92

Item 13

0,62

0,41

3,48 (0,95)

0,53

0,92

Item 24

0,60

0,47

3,42 (0,92)

0,55

0,92

Item 18

0,59

0,54

3,45 (0,88

0,65

0,92

Item 16

0,57

0,55

3,68 (0,96)

0,62

0,92

Item 2

0,56

0,57

3,96 (0,99)

0,60

0,92

Item 1

0,53

0,60

3,78 (0,93)

0,64

0,92

Item 25

0,53

0,49

3,92 (0,95)

0,59

0,92

Item 11

0,50

0,51

3,81 (0,92)

0,55

0,92

Item 4

0,48

0,44

3,84 (0,90)

0,55

0,92

Item 3

0,46

0,56

3,84 (0,93)

0,61

0,92

Item 19

0,43

0,59

3,47 (0,97)

0,69

0,92

Item 10

0,39

0,52

3,66 (0,93)

0,64

0,92

Item 8

0,35

0,39

3,74 (1,00)

0,49

0,93

Item 21

0,88

0,52

3,13 (0,95)

0,47

0,93

Item 22

0,83

0,48

3,43 (1,03)

0,51

0,93

Item 20

0,55

0,44

3,92 (0,97)

0,53

0,92

Item 14

0,54

0,46

2,93 (1,14)

0,54

0,93

Item 17

0,48

0,51

2,79 (1,06)

0,60

0,92

Item 12

0,46

0,46

2,98 (0,99)

0,52

0,92

Item 15

0,41

0,36

3,11 (1,09)

0,48

0,92

Item 23

0,40

0,34

3,74 (1,07)

0,41

0,93

Valor próprio

9,27

1,76

% Variância

37,09

7,05

α Cronbach

0,92

0,83

Total

88,82 (14,74)

Nota. N = 258. AFE = Análise Fatorial Exploratória; SEE = Socio-Emotional Expertise.

Na Tabela 2 é possível comparar os itens que incluem cada um dos fatores da versão original da SEE e da versão portuguesa. Na versão portuguesa, os itens 3, 10 e 25 migraram do fator 2 (versão original) para o Fator 1. Por sua vez, os itens 12, 15 e 17 migraram do Fator 1 (versão original) para o Fator 2 (versão portuguesa).

Tabela 2

Comparação dos Fatores da Versão Original e Portuguesa da SEE

Fator Adaptabilidade

Fator Expressividade

Versão original

1, 2, 4, 5, 6, 7, 8, 9, 12, 13, 15, 16, 17, 18, 19, e 24

3, 10, 11, 14, 20, 21, 22, 23, e 25

Versão portuguesa

1, 2, 3, 4, 5, 6, 7, 8, 9, 10, 11, 13, 16, 18, 19, 24 e 25

12, 14, 15, 17, 20, 21, 22 e 23

Nota . SEE = Socio-Emotional Expertise.

Dadas as pequenas diferenças na constituição dos fatores da versão inglesa e portuguesa, foi explorada a associação entre os fatores das duas versões. Para esse fim, para além dos fatores encontrados na amostra portuguesa, foram também calculados nesta amostra os fatores descritos na versão original. Os resultados mostraram uma correlação muito alta quer para o FatorAdaptabilidade (r = 0,96; p < 0,001), quer para o FatorExpressividade (r = 0,91, p < 0,001), sugerindo assim uma estrutura equivalente na versão inglesa e portuguesa.

Os fatores de adaptabilidade e expressividade apresentaram uma correlação moderada entre si (r = 0,65; p < 0,001). A pontuação global da escala apresentou uma correlação elevada com o Fator Adaptabilidade (r = 0,94; p < 0,001) e com o FatorExpressividade, (r = 0,85; p < 0,001).

Análise Fatorial Confirmatória

A solução de dois fatores apontada pela AFE foi testada numa amostra independente de 208 participantes através de uma AFC. Uma vez que a escala original inglesa permite obter uma pontuação global de competências socioemocionais (tendo em conta a correlação elevada entre os dois fatores), foi testado o modelo hierárquico de segunda ordem da SEE, no qual os itens foram especificados para saturar nos dois fatores de primeira ordem — Adaptabilidade e Expressividade —, os quais, por sua vez, foram especificados para saturar no fator de ordem superior relativo à pontuação global da SEE (Figura 1).


Figura 1

Especificação do modelo CFA para a Estrutura Fatorial da Escala Social-Emotional Expertise

Nota. Valores estandardizados (p< 0,001).

Este modelo revelou um ajustamento inaceitável (χ2(274) = 658,16; p < 0,001; CMIN/ gl = 2,40; GFI = 0,79; TLI = 0,77; CFI = 0,79; RMSEA = 0,08 [90%IC 0,07–0,09; p < 0,001] e SRMR = 0,07). Procedeu-se à análise dos índices de modificação, cujos resultados sugeriram a intercorrelação dos erros entre dois pares de itens do FatorAdaptabilidade (e5–e6 e e16–e18) e um par de itens do FatorExpressividade (e14–e20). Estas covariâncias de erro são teoricamente justificadas tendo em conta a semelhança do conteúdo dos itens e melhoraram o ajustamento global do modelo, ainda que sofrível (χ2(271) = 595,32; p < 0,001; CMIN/gl = 2,20;GFI = 0,81; TLI = 0,80; CFI = 0,82;RMSEA = 0,08 [90%IC 0,07–0,08; p < 0,001] e SRMR = 0,07).

Tabela 3

Análise Fatorial Confirmatória da SEE

Itens

Pesos fatoriais estandardizados

Correlações múltiplas ao quadrado

1

0,48

0,23

2

0,67

0,45

3

0,52

0,27

4

0,64

0,40

5

0,52

0,27

6

0,64

0,40

7

0,43

0,19

8

0,55

0,30

9

0,79

0,62

10

0,63

0,40

11

0,57

0,32

12

0,57

0,18

13

0,60

0,32

14

0,63

0,32

15

0,69

0,24

16

0,55

0,36

17

0,54

0,35

18

0,43

0,39

19

0,57

0,47

20

0,49

0,30

21

0,59

0,40

22

0,54

0,34

23

0,63

0,18

24

0,58

0,30

25

0,43

0,29

Nota. N =208. SEE = Socio-Emotional Expertise. São apresentados os pesos fatoriais estandardizados (λ) e correlações múltiplas ao quadrado ( r2) numa amostra independente.

Relativamente aos indicadores de ajustamento local (Tabela 3), os valores dos pesos fatoriais padronizados dos itens do Fator Adaptabilidade variaram entre 0,43 (Item 7) e 0,79 (Item 9), e do FatorExpressividade variaram entre 0,43 (Itens 12 e 23) e 0,63 (Itens 10 e 21). As correlações múltiplas ao quadrado variaram entre 0,19 (item 7) e 0,62 (item 9) para o FatorAdaptabilidade e entre 0,18 (Itens, 12 e 23) e 0,40 (Item 21) para o Fator Expressividade. A maioria dos itens cumpriu o critério recomendável, com pesos fatoriais acima de 0,50 e de correlações múltiplas ao quadrado acima de 0,25 ( Tabachnick & Fidell, 2007). Os dois fatores de Adaptabilidade e Expressividade de primeira ordem carregaram significativamente no fator de segunda ordem referente à pontuação global de competências socioemocionais (0,88 e 0,99, respetivamente, Figura 1).

Consistência Interna da SEE

Para determinar a fidedignidade de todos os itens que constituem a escala SEE, foi calculado o alfa de Cronbach. A fidedignidade foi confirmada pelo cálculo da fiabilidade compósita (FC), encontrando os valores de 0,95, 0,93 e 0,83, para a pontuação global, Fator 1 e Fator 2, respetivamente. As médias, desvios padrões, correlações item-total e alfas de Cronbach para cada item da escala SEE são apresentados na Tabela 1. Como podemos verificar, todas as correlações item-total mostraram valores superiores a 0,40, e os alfas de Cronbach de cada item variaram entre 0,92 e 0,93, razão pela qual não foi eliminado nenhum item da escala.

Fidedignidade Teste-reteste

Para analisar a fidedignidade teste-reteste, a escala da SEE foi novamente preenchida (reteste) por 58 participantes [51 mulheres e 7 homens com uma média de idade de 25,47 (DP = 9,50)] com um intervalo de quatro semanas. Foi obtida uma correlação moderada e estatisticamente significativa entre os resultados recolhidos nos dois momentos (r = 0,58; p < 0,001). A correlação intraclasse foi de 0,56 [95% CI 0,49-0,63; p < 0,001]. A fidedignidade teste-reteste foi também confirmada através da comparação dos valores médios nos dois momentos com recurso ao teste t de Student para amostras emparelhadas. Não foram encontradas diferenças estatisticamente significativas entre os dois momentos (t(57) = 1,00; p = 0,320), assegurando a estabilidade temporal.

Validade Convergente e Divergente

Para analisar a validade convergente e divergente da SEE, foram calculados os coeficientes de correlação de Pearson entre as competências socioemocionais (SEE) e Inteligência emocional (SEIS), felicidade subjetiva (SHS) e ansiedade de interação social (SIAS). Como podemos verificar na Tabela 4, todos os coeficientes de correlação entre a SEE e as outras medidas foram estatisticamente significativos (p < 0,05) e variaram entre 0,58 e -0,16.

Tabela 4

Correlações Entre a SEE (total e fatores) e Outras Medidas

Escalas

1

2

3

4

5

1. Fator Adaptabilidade

2. Fator Expressividade

0,65**

3. SEE Total

0,94**

0,85**

4. SHS

0,27**

0,16*

0,26**

5. SIAS

-0,39**

-0,18*

-0,36**

-0,44**

6. SEIS

0,56**

0,48**

0,58**

0,38**

-0,31**

Nota. N = 258. SEE = Social-Emotional Expertise; SEIS =Schutte Emotional Intelligence Scale; SHS =Subjective Happiness Scale; SIAS = Social Interaction Anxiety Scale.
** p < 0,001; * p < 0,05.

No que refere à validade convergente, o valor global da SEE apresentou uma associação positiva moderada com a inteligência emocional avaliada pela escala SEIS e baixa com a escala de felicidade subjetiva. Como validade divergente, a SEE (global) apresentou um coeficiente de correlação baixo negativo estatisticamente significativo com a escala a ansiedade de interação social (SIAS). Relativamente aos fatores da SEE, verificou-se que o Fator 1, designado de Adaptabilidade, evidenciou correlações mais elevadas com as restantes variáveis, que o Fator 2, nomeado de Expressividade.

Análise das Variáveis Sociodemográficas nos Valores Médios da SEE

Não foram encontradas diferenças significativas de sexo, nem para o total da SEE (t (257) = -1,94, p = 0,057), nem para o Fator 1 (t (257) = -1,91; p = 0,062) e Fator 2 (t (257) = -1,77; p = 0,083). A idade não se mostrou associada com o total (r = -0,21; p = 0,113), Fator 1 (r = -0,21; p = 0,110) e Fator 2 (r = -0,20; p = 0,130). O mesmo o padrão foi encontrado para a escolaridade que não se mostrou associada ao total da SEE (r = 0,05; p = 0,409), Fator 1 (r = 0,05; p = 0,463) e Fator 2 (r = 0,04; p = 0,575).

Discussão

Dada a lacuna de instrumentos de avaliação no domínio de competências socioemocionais, a tradução e validação da escala Social-Emotional Expertise (SEE) para a população Portuguesa apresentou-se como objetivo central deste estudo, tendo em conta o seu modelo inovador e robustez psicométrica. A exploração das dimensões da escala, o estudo da sua consistência interna, estabilidade temporal e validade convergente e divergente constituíram os seus objetivos específicos.

Com base na análise fatorial exploratória (AFE), foi possível identificar a presença de dois fatores; o Fator Adaptabilidade englobou 17 itens que avaliam as competências que o indivíduo possui para se adaptar facilmente a uma variedade de inter-relações sociais e emocionais, e o Fator Expressividade composto por oito itens que avaliam as competências que o indivíduo possui para expressar emoções aos outros. Os 25 itens da escala evidenciaram saturações fatoriais elevadas, bem como correlações item-total moderadas, pelo que não foi eliminado qualquer item, mantendo assim a estrutura da versão original ( McBrien et al., 2018). Comparadas as estruturas fatoriais da versão inglesa original e da versão portuguesa, verificaram-se ligeiras alterações na distribuição dos itens pelos dois fatores. Apesar da composição dos fatores se ter conservado na sua globalidade, mantendo-se a localização dos itens com maior peso fatorial, verificou-se, igualmente, a migração de alguns itens na versão portuguesa. Estes dados podem, em parte, ser explicados pela associação moderada entre os dois fatores (Adaptabilidade e Expressividade). De notar, contudo, que na comparação da estrutura fatorial da versão inglesa e portuguesa, foi confirmada a existência de uma correlação muito alta entre os fatores de cada uma das versões, sugerindo que os fatores da versão portuguesa estão a medir o mesmo que os da versão inglesa.

A AFC permitiu confirmar o modelo bifatorial de segunda ordem, ou seja, com uma pontuação global de ordem superior e dois fatores de primeira ordem (encontrados na AFE). Refira-se, contudo que houve necessidade de proceder à correlação entre resíduos de itens, sugeridos pelos índices de modificação. Estas correlações podem ser justificadas pela semelhança de conteúdo. Por exemplo, relativamente aos resíduos do par formado pelo Item 5 (“Sou bom/boa a confrontar as pessoas sobre situações delicadas sem as fazer sentir constrangidas ou desrespeitadas” e pelo Item 6 (“Posso mostrar o meu aborrecimento sem deixar as pessoas chateadas ou magoadas”), pode ser hipotetizado este par refletir competências idênticas face a uma situação de interação social. De notar ainda que o modelo testado, apesar de aceitável, revelou um ajustamento sofrível nos diversos indicadores globais. Quanto aos indicadores de ajustamento local, a maioria dos itens apresentou valores recomendados como adequados (e.g., Tabachnick & Fidell, 2007). Seria recomendável a realização destas análises em novas amostras de forma a confirmar a estrutura fatorial da SEE.

No que refere à fidedignidade, a versão portuguesa da SEE apresentou uma excelente consistência interna para o total e fatores, corroborando os valores encontrados na versão inglesa original (α de Cronbach = 0,90; α de CronbachAdaptabilidade = 0,91; α de CronbachExpressividade = 0,82; McBrien et al., 2018). Estes resultados foram confirmados pelos valores de fiabilidade compósita, suportando, assim, a fidedignidade da escala para avaliar a competência socioemocional.

O estudo da estabilidade temporal, no intervalo de quatro semanas, mostrou que a versão portuguesa da SEE apresenta uma fidedignidade teste-reteste adequada.

Na análise da validade convergente a pontuação global da SEE apresentou uma correlação positiva de efeito moderado e baixo, respetivamente, com a inteligência emocional e com a felicidade subjetiva. Assim, os nossos dados sugerem que quanto maior é a proficiência socioemocional do indivíduo em situações interpessoais, maior é capacidade de autoconhecimento e autocontrole emocional, automotivação e empatia, assim como a vivência de maior satisfação com a vida. Estes resultados são corroborados por outros estudos que evidenciaram uma estreita relação entre as competências socioemocionais e a inteligência emocional (Marin et al., 2017; Nakano et al., 2019), bem como com a felicidade subjetiva (Gondim et al., 2014). Quanto à validade divergente, a SEE mostrou uma correlação negativa com a ansiedade de interação social, indicando que quanto mais competências socioemocionais os indivíduos apresentam, menos ansiedade em interagir com outras pessoas, menos receio de dar a sua opinião ou falar em público. Também o estudo de Lordo et al. (2016), direcionado para adolescentes, evidenciou uma correlação negativa entre a ansiedade social e as competências sociais, realçando a importância do desenvolvimento destas aptidões com a finalidade de diminuir níveis de ansiedade social, ou até de prevenir comportamentos antissociais, independentemente da faixa etária do indivíduo. Os nossos dados sugerem que o Fator Adaptabilidade poderá ter um papel mais relevante que o Fator Expressividade , já que mostrou uma associação mais expressiva com as variáveis em estudo, facto que poderá ter implicações práticas. Por exemplo, no caso dos indivíduos com ansiedade social, as competências de flexibilidade de resposta à situação social (fator adaptabilidade) parecem ser mais relevantes que as competências de expressão de sentimentos ou emoções. Os resultados obtidos surgiram no sentido esperado, estando igualmente em sintonia com os resultados encontrados pelos autores da escala inglesa ( McBrien et al., 2018).

Por último, relativamente à análise das variáveis sociodemográficas, parece não haver influência do sexo, idade e escolaridade nas competências socioemocionais avaliadas pela SEE. Por outras palavras, os valores médios obtidos na SEE não se distinguiram em função do sexo, nem se mostraram associados à idade e escolaridade, contrariamente aos dados do estudo da versão original (McBrien et al., 2018). Na verdade, estes autores encontraram diferenças significativas entre os sexos masculino e feminino na pontuação total e na capacidade de expressar as emoções aos outros (Fator Expressividade), onde as mulheres mostraram valores mais elevados que os homens. Já em relação ao Fator Adaptabilidade, não foram reportadas diferenças entre homens e mulheres. Seria importante estudos futuros clarificarem o papel destas variáveis sociodemográficas. Uma eventual hipótese para justificar a discrepância dos nossos resultados prende-se com a distribuição desigual entre homens e mulheres da amostra.

No presente estudo manifestaram-se algumas limitações que devem ser tidas em conta. Uma, foi já anteriormente apontada, passa pelo desequilíbrio na proporção entre homens e mulheres que compuseram esta amostra. Devido ao confinamento da pandemia Covid-19, a recolha de dados foi realizada online, e não presencialmente, pelo que não foi possível controlar as condições de preenchimento do protocolo ou assegurar qualquer esclarecimento que fosse necessário. A natureza transversal e correlacional do estudo é outra das limitações a considerar, pois não permite o estabelecimento de relações causais entre as variáveis. A utilização exclusiva de instrumentos de autorrelato também pode ter condicionado os dados obtidos. A utilização de medidas de observação, de uma entrevista estruturada ou de avaliações externas da qualidade de interação poderiam constituir aspetos enriquecedores no estudo da competência socioemocional.

Apesar das limitações apontadas, este estudo disponibiliza um novo instrumento para a população Portuguesa, contribuindo para uma clarificação do construto de competência socioemocional e sua relação com outros conceitos teoricamente relevantes. Com este estudo, podemos concluir que a versão portuguesa da SEE reúne características psicométricas adequadas para a sua utilização, alargando, consequentemente, a investigação ao nível da avaliação e intervenção, em contexto educativo e clínico. Tendo em conta a importância amplamente reconhecida da competência socioemocional no desenvolvimento bem-sucedido e harmonioso do indivíduo e na promoção da saúde mental em geral, o estudo de um novo instrumento constitui uma mais valia, abrindo novas vias de investigação.

Conflito de interesses | Conflict of interest: Não existe conflito de interesses por parte dos autores | none.
Fontes de financiamento | Funding sources: Não se aplica | none.
Contributos: ABS: Desenho da investigação; Pesquisa bibliográfica; Revisão de literatura; Recolha de dados; Análise estatística; Discussão dos dados; Elaboração do manuscrito; MC: Desenho da investigação; Análise estatística; Discussão dos dados; Supervisão da escrita do manuscrito e aprovação do manuscrito final; MN: Recolha de dados e revisão final do manuscrito; IMC: Reflexão crítica dos resultados; Revisão final do manuscrito e aprovação do manuscrito final; AG: Reflexão crítica dos resultados; Revisão final do manuscrito e aprovação do manuscrito final.

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