2016, Vol. 2(2): 2-11

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Literacia em saúde mental acerca da depressão e abuso de álcool de adolescentes e jovens portugueses

 

Artigo Original 

 

Luís Loureiro

 

https://doi.org/10.7342/ismt.rpics.2016.2.2.38

 

Recebido 08 junho 2016

Aceite 27 setembro 2016

 

 

ÍNDICE

RESUMO

INTRODUÇÃO

MÉTODOS

RESULTADOS

DISCUSSÃO

REFERÊNCIAS

 

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RESUMO

Objetivo: Este estudo tem como objetivos comparar a literacia em saúde mental dos adolescentes e jovens portugueses, relativamente à depressão e ao abuso de álcool e analisar o padrão de respostas em termos de consistência e concordância para ambas as perturbações.

Métodos: A amostra é constituída por 4938 adolescentes e jovens, 43,0% do sexo masculino e 56,7% do sexo feminino, com uma média de idades de 16,75 anos (desvio padrão = 1,62 anos), que frequentam as escolas do 3.º ciclo do ensino básico e do ensino secundário, pertencentes à Direção Regional de Educação do Centro. Para a colheita de dados foi utilizado o QuALiSMental (LSM).

Resultados: Os resultados revelam um nível de LSM modesto na generalidade das componentes. Ainda que se encontrem diferenças estatisticamente significativas (p < 0,05) em 88,0% dos itens da LSM, o que indicia diferentes formas de encarar ambos os problemas de saúde mental, os resultados revelam consistência, em termos das componentes conhecimentos e competências para prestar a primeira ajuda e apoio aos outros e conhecimentos acerca do modo de prevenção das perturbações mentais.

 

Palavras chave: Literacia saúde mental · Depressão · Abuso álcool · Adolescentes · Jovens

 

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INTRODUÇÃO

 

A adolescência e a juventude correspondem a períodos considerados críticos no ciclo de vida dos indivíduos, caracterizando-se por mudanças e transições significativas e em que os problemas de saúde mental, se não existirem intervenções precoces, atempadas e ajustadas aos problemas, podem vir a ter profundo impacto na sua vida, ao ponto de poder comprometer o seu potencial de desenvolvimento e, consequentemente, o seu futuro (Loureiro, 2013; Loureiro, Pedreiro, & Correira, 2015; Loureiro et al., 2013; Rickwood, Deane, Wilson, & Ciarrochi, 2005). As estimativas da prevalência de perturbações mentais em adolescentes e jovens apontam para que a depressão, o abuso de substâncias (com ênfase para o álcool), os distúrbios de ansiedade, os distúrbios alimentares e, inclusive, as perturbações psicóticas se situem cumulativamente entre os 15 e os 20% (Rickwood et al., 2005).

Simultaneamente, uma outra evidência torna-se relevante e diz respeito ao facto de 50% das pessoas com perturbação mental diagnosticada terem tido os primeiros sintomas antes dos 18 anos e 75% antes dos 25 anos (Kelly et al., 2011).

Ambos os dados remetem para a necessidade de desenvolver intervenções junto destes grupos, de modo não só a prevenir a ocorrência de problemas de saúde mental, mas, se for caso disso, reduzir o tempo que medeia entre o despoletar dos primeiros sinais e sintomas e a procura de ajuda especializada que, muitas vezes, ocorre tardiamente.

O conceito de literacia em saúde mental (LSM), entendido como a constelação de crenças e conhecimentos que permitem aos indivíduos reconhecer, gerir (no sentido de autocuidado) e prevenir os problemas e perturbações mentais (Jorm, 2000, 2012, 2014), veio permitir desenvolver diversas tipologias de intervenção (Loureiro, 2014) e disponibilizá-las para quem se relaciona e faz do seu quotidiano profissional o trabalho com adolescentes, nomeadamente, professores e demais atores do sistema educativo e da saúde, inclusive, pais e encarregados de educação (Loureiro, Sousa, & Gomes, 2014).

A LSM, tal como acima definida, não se refere apenas a um conhecimento teórico, mas é um conhecimento voltado para a ação em prol da saúde mental do próprio indivíduo e dos seus pares (Jorm, 2012). O conceito compreende cinco componentes, nomeadamente: a) reconhecimento das perturbações mentais de modo a promover a procura de ajuda; b) conhecimentos acerca da ajuda profissional e tratamentos disponíveis; c) conhecimentos acerca da eficácia das estratégias de autoajuda; d) conhecimentos e competências para prestar a primeira ajuda e apoio aos outros; e) conhecimentos acerca do modo de prevenção das perturbações mentais (Jorm, 2014).

A síntese da evidência produzida relativamente à LSM de adolescentes e jovens, resultado de diversos estudos e revisões integrativas efetuadas (Jorm, 2012, 2014), mostra, para cada componente, resultados que constituem simultaneamente um estímulo e um desafio para aqueles que intervêm no contexto das práticas promotoras e preventivas associadas às perturbações mentais. Sabe-se, por exemplo, que:

a) muitos adolescentes e jovens atrasam, recusam ou mesmo não procuram ajuda, quando a evidência mostra que os atrasos estão associados a piores resultados de saúde no futuro e que o não reconhecimento do problema tem maior probabilidade de ocorrer se os primeiros episódios acontecerem na adolescência (Jorm, 2012, 2014). Esta situação é agravada pelo facto dos adolescentes e jovens serem os grupos com menor contacto com o sistema de saúde (Loureiro et al., 2013); b) os adolescentes e jovens e, inclusive, os adultos tendem a privilegiar as fontes informais de ajuda (familiares e amigos) e isto pode constituir um problema, particularmente durante a adolescência, sobretudo se pais, encarregados de educação, professores e, inclusive, os profissionais que trabalham na área da saúde escolar não estiverem sensibilizados para estas problemáticas e o que elas implicam; c) os profissionais com formação especializada (p. ex., psicólogos) nem sempre são os preferidos pelos sujeitos que procuram ajuda, tal como existe uma imagem negativa dos tratamentos com psicofármacos (Jorm, 2014); d) os adolescentes e jovens tendem apresentar uma atitude positiva, no que diz respeito às estratégias de autoajuda e refere utilizá-las com frequência, sobretudo para problemas de ansiedade e de depressão (Jorm, 2012; Loureiro et al., 2013). São exemplos do referido anteriormente, a prática de exercício físico regular, a manutenção de hábitos regulares de sono, e ainda, estratégias interpessoais, como falar acerca dos seus problemas com os amigos;

No que concerne à comparação da LSM acerca da depressão e do abuso de álcool, não existem estudos publicados e os estudos comparativos existentes cingem-se, na sua quase totalidade, à depressão e esquizofrenia (Melas et al., 2013; Wright et al., 2005). É de salientar também o facto da LSM acerca do abuso de álcool, comparativamente à depressão, não ter merecido a atenção e destaque, em termos nacionais e internacionais, ainda que se encontrem no contexto português diversos estudos relativos aos comportamentos e hábitos de consumo de álcool de adolescentes e jovens Portugueses (Feijão, 2010; Reis et al., 2011; Simões, Matos, & Batista-Foguet, 2006).

Face a estas constatações, surge a necessidade de desenvolver estudos relativos a LSM de adolescentes e jovens relativamente a estes problemas de saúde, pois os resultados podem constituir-se como ferramentas fundamentais para quem pretende desenvolver intervenções em contexto escolar, já que permitem priorizar áreas de atuação e, sobretudo, adequar objetivos, estratégias aos públicos e seus contextos, pressuposto básico para quem desenha intervenções.

Este estudo tem como objetivos comparar a literacia em saúde mental dos adolescentes e jovens portugueses, relativamente à depressão e ao abuso de álcool e analisar o padrão de respostas em termos de consistência e concordância para ambas as perturbações.

 

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MÉTODO

Participantes

Este estudo é de natureza quantitativa, nível descritivo-correlacional, tendo a colheita de dados sido realizada na região centro de Portugal Continental, a partir de uma amostra de adolescentes e jovens com idades compreendidas entre os 14 e os 24 anos, a frequentarem o 3.º ciclo do ensino básico e o ensino secundário de 50 escolas, enquadradas na Direção Regional de Educação do Centro (DREC). Foi utilizada uma amostragem multietapas por clusters, recorrendo ao Random Sequence Generator para a seleção das escolas e turmas, sendo a amostra constituída por 4938 adolescentes e jovens, 43,3% do sexo masculino e 56,7% do sexo feminino, com uma média de idade de 16,75 anos e desvio padrão de 1,62 anos.

Material

O instrumento de colheita de dados (QuaLiSMental) é constituído por um conjunto de itens que pretendem avaliar as cinco diferentes componentes da literacia em saúde mental, utilizando diversos formatos de resposta, tal como se apresenta em detalhe na descrição do instrumento (Loureiro, 2015; Loureiro et al., 2013).

A 1.ª parte inclui as instruções de preenchimento e questões de caracterização sociodemográfica (género, idade, local de residência, distrito e habilitações literárias dos pais). A 2.ª parte do questionário é constituída por diferentes seções relativas a cada componente da literacia em saúde mental. Previamente às questões relativas às componentes, são apresentadas duas vinhetas relatando um caso de depressão e um caso de abuso de álcool, de acordo com os critérios de diagnóstico de abuso de álcool da DSM-IV-TR (APA, 2006). A consulta das vinhetas utilizadas poderá ser feita a partir dos trabalhos publicados e disponíveis online (Loureiro, Barroso et al., 2013; Loureiro et al., 2013).

A componente reconhecimento das perturbações é constituída por vários rótulos que os indivíduos podem assinalar no formato de escolha múltipla. Além dos rótulos (p. ex., depressão, esgotamento nervoso), inclui ainda as opções de resposta, não tem nada, não sei, tem um problema.

A componente conhecimento sobre os profissionais e tratamentos disponíveis é constituída por um total de 16 itens, sendo o formato de resposta: útil, prejudicial, e nem uma coisa nem outra.

As componentes conhecimento sobre a eficácia das estratégias de autoajuda e conhecimento e as competências para prestar apoio e primeira ajuda aos outros, são constituídas respetivamente por 12 itens e 10 itens, sendo o formato de resposta: útil, prejudicial, e nem uma coisa nem outra.

A última componente da literacia em saúde mental que surge no QuALiSMental (conhecimento acerca do modo de como se podem prevenir as perturbações mentais) é constituída por 8 itens, sendo o formato de resposta: sim; não e não sei. O conteúdo dos itens encontra-se nas tabelas apresentadas neste artigo.

Procedimentos

Os dados foram colhidos entre os meses de novembro de 2011 e maio de 2012, tendo sido utilizada amostragem por clusters. O questionário foi administrado em espaço de sala de aula, em sessões coletivas, com supervisão de um membro da equipa e de um professor da turma. O tempo de resposta ao questionário situou-se entre 40 a 50 minutos.

Considerações ético-legais

O QuALiSMental foi submetido à Direção-Geral de Inovação e de Desenvolvimento Curricular do Ministério da Educação do Governo Português (processo n.º 0252500001) e à Comissão de Ética da Unidade de Investigação em Ciências da Saúde – Enfermagem (UICISA: E) da Escola Superior de Enfermagem de Coimbra (N.º P58-12/2011). Em ambos os casos o parecer foi positivo, tendo sido aprovada a sua utilização e autorizada a aplicação. Dadas as características da amostra (na maioria menores de idade), o instrumento era acompanhado pelo formulário de consentimento informado para assinar pelos pais/encarregados de educação ou, nos casos em que os jovens tinham idade igual ou superior a 18 anos, um formulário de consentimento próprio.

Análise estatística

Os dados foram inseridos e tratados no IBM-SPSS 22. Foram calculadas as estatísticas resumo adequadas e as frequências absolutas e percentuais, sempre que necessário. O trabalho estatístico foi feito da forma descrita seguidamente.

O estudo da consistência foi realizado com recurso a uma macro do IBM-SPSS 22, desenvolvida de modo a permitir utilizar o teste de McNemar. Para isso, o formato de resposta dos itens nas componentes relativas aos conhecimentos da ajuda profissional e tratamentos disponíveis; conhecimentos acerca da eficácia das estratégias de autoajuda; e conhecimentos e competências para prestar a primeira ajuda e apoio a outros, foram dicotomizados em termos de útil (Código 1: referência “+”) e prejudicial e nem uma coisa nem outra (Código 2: referência “–”). Os itens relativos à componente conhecimento acerca do modo de como se podem prevenir as perturbações mentais foram dicotomizados em sim (Código 1: referência “+”) e não e não sei (Código 2: referência “-”)

O estudo da concordância foi efetuado do seguinte modo. Primeiro, foi calculado o coeficiente de concordância capa de Cohen e respetivo teste de significância e, posteriormente, foi calculada a proporção de concordância específica. Neste caso, os acordos específicos positivos são dados por (AEP) = [(2a) / (N + a - b)]. Este procedimento foi efetuado para todos os itens de cada componente, comparando as vinhetas da depressão e do abuso de álcool. No entanto, dada a necessidade de condensar os resultados de modo a transmitir a informação essencial, de acordo com aquele que é o objetivo deste estudo comparativo, apenas se apresentam as distribuições de frequências percentuais respeitantes às respostas “sim” e “útil” para cada um dos itens de todas as componentes, incluído as medidas e estatísticas já referidas.

Sendo os mesmos indivíduos que respondem às mesmas questões para ambas as vinhetas, trata-se de uma amostra emparelhada, sendo apenas diferenciado o estímulo (vinheta).

 

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RESULTADOS

 

 

Reconhecimento das perturbações de modo a facilitar a procura de ajuda

No que respeita à primeira componente da literacia, os resultados mostram um perfil de respostas que indiciam uma visão muito diferenciada na utilização dos rótulos para cada vinheta (Tabela 1), ainda que em alguns casos a diferença estatística encontrada seja devida ao tamanho amostral, não reportando uma diferença com significado substancial, o que de certo modo também está patente nos valores da significância dos coeficientes de concordância.

Assim a estatística do teste de McNemar mostra que as diferenças de percentagens, quando comparados os rótulos em função das vinhetas, são todas estatisticamente significativas, sendo comparativamente superiores na vinheta da depressão as percentagens assinaladas nos rótulos: depressão (c2(1)=2813,18; p < 0,001), stress (c2(1) = 1567,84; p < 0,001), esgotamento nervoso (c2(1)=1349,10; p < 0,001), problemas psicológicos/mentais/ emocionais (c2(1)= 960,15; p < 0,001) e anorexia (c2(1) = 762,60; p < 0,001). Ao nível do abuso de álcool, observa-se que os rótulos com maiores diferenças estatísticas e em que a utilização é comparativamente superior são os rótulos: abuso de substância (c2(1) = 3295,20; p <0,001) e alcoolismo (c2(1) = 3350,08; p < 0,001. A análise da concordância através do coeficiente capa revela que, apesar de 12 deles (75,0%) serem estatisticamente significativos, os valores dos coeficientes são muitíssimo baixos, sugerindo uma quase ausência de concordância o que, aliás, é reconfirmado pelos valores das proporções de concordância específica encontrados.

Conhecimentos acerca da ajuda profissional e tratamentos disponíveis

Em termos de profissionais de saúde que poderão ajudar, observa-se que são percecionados como úteis por uma grande margem de adolescentes e jovens, que as diferenças com maior significado se situam ao nível do psicólogo (c2(1) = 369,80; p < 0,001) e do psiquiatra (c2(1) = 161,79; p < 0,001). Nas fontes informais de ajuda, as diferenças não apresentam significado estatístico, o que denota a importância que atribuem aos familiares e amigos em ambos os casos. Dois factos são ainda relevantes. Por um lado, o psicólogo é considerado útil por uma percentagem mais elevada no caso da depressão (89,0%) do que no abuso de álcool (76,8%), por outro, o médico de família, que representa a porta de entrada no sistema de saúde, é considerado útil para ambos os casos, por uma cerca de ¾ da amostra.

Os coeficientes capa obtidos variam entre k = 0,33 (p < 0,001) e k = 0,46 (p < 0,001), revelando concordâncias moderadas entre aquela que é perceção de utilidade relativamente aos profissionais adequados em ambos os casos. Esta tendência é mais vincada no médico de família (0,85), psicólogo (0,88) e nos familiares próximos (0,85) e amigos significativos (0,90).

Em termos de produtos não sujeitos a prescrição médica, observa-se claramente uma preferência e utilidade das vitaminas (c2(1) = 1095,99; p < 0,001) e chás (c2(1) = 176,87; p < 0,001) para a depressão, comparativamente ao abuso de álcool. Este sentido mantem-se, em termos dos produtos sujeitos a prescrição, como são os antidepressivos (c2(1) = 904,86; p < 0,001) e os comprimidos para dormir (c2(1) = 550,63; p < 0,001). Os valores baixos dos coeficientes e proporções de acordos específicos, confirmam esta diferença na perceção de ambos os problemas e na adequação dos psicofármacos. Ainda assim, uma margem reduzida considera úteis os antipsicóticos, respetivamente 8,8% e 9,7%.

 

 

 

TABELA 1

Distribuições Percentuais das Respostas Assinaladas para cada Rótulo em Ambas as Vinhetas e Perceção de Utilidade em Termos de Conhecimentos da Ajuda Profissional e Tratamentos Disponíveis (N = 4938)

 

 

 

Vinhetas

c2(a)

K(b,c)

 

 

Depressão

Abuso de álcool

 

 

Rótulos

Não sei

Nada

Depressão

Esquizofrenia

Psicose

Doença mental

Bulimia

Stress

Esgotamento nervoso

Abuso de substância

Crise da idade

Problemas psicológicos/emocionais…

Anorexia

Tem um problema

Alcoolismo

Cancro

 

2,7

0,4

67,1

0,7

0,9

5,5

6,5

47,3

33,8

3,2

14,8

40,8

16,4

22,7

0,9

1,2

 

3,6

3,1

6,5

0,5

0,6

2,9

0,3

9,6

3,2

72,4

21,9

13,8

0,2

19,4

70,3

0,2

 

9,65**

110,72***

2813,18***

2,20ns

4,19*

45,94***

278,77***

1567,84***

1349,10***

3295,20***

92,68***

960,15***

762,60***

19,88***

3350,08***

34,91***

 

0,25*** (0,23)

0,08*** (0,08)

0,02*** (0,14)

0,09*** (0,10)

0,02ns (0,03)

0,17*** (0,21)

0,02*** (0,02)

0,08*** (0,22)

0,03*** (0,09)

0,01* (0,07)

0,14*** (0,29)

0,15*** (0,32)

0,00ns (0,00)

0,33*** (0,47)

0,00ns (0,02)

0,03** (0,03)

 

 

Pessoas que podem ajudar

Um médico de família

Um professor

Um psicólogo

Um enfermeiro

Um assistente social

Um psiquiatra

Um serviço telefónico

Um familiar próximo

Um amigo significativo

 

74,6

27,6

89,0

49,1

14,6

55,1

16,4

75,2

80,9

 

77,8

28,1

76,8

54,6

19,3

45,0

26,4

75,2

81,3

 

21,85***

0,67ns

369,80***

54,32***

251.17***

161,79***

267,04***

0,01ns

0,84ns

 

0,38*** (0,85)

0,41*** (0,58)

0,32*** (0,88)

0,46*** (0,74)

0,33*** (0,45)

0,38*** (0.69)

0,45*** (0,56)

0,40*** (0,85)

0,45*** (0.90)

 

 

Medicamentos/produtos

Vitaminas

Chás (Ex.: Camomila ou Hipericão)

Tranquilizantes/Calmantes

Antidepressivos

Antipsicóticos

Comprimidos para dormir

 

65,5

54,0

29,9

37,7

8,8

29,3

 

35,2

43,0

22,3

12,6

9,7

11,5

 

1095,99***

176,87***

98,36***

904,86***

3,73*

550,63***

 

0.24*** (0,59)

0,33*** (0,65)

0,25*** (0,44)

0,17*** (0,33)

0,29*** (0,35)

0,17*** (0,30)

 

 

Nota. ***p < 0,001; **p < 0,01; *p < 0,05; ns = não significativo.  (a) Estatística do qui-quadrado do teste de McNemar. (b) Medida de concordância k de Cohen. (c) Entre parêntesis: proporção de acordos específicos positivos.

 

 

Conhecimentos acerca da eficácia das estratégias de autoajuda

Em termos desta componente (Tabela 2), os resultados mostram diferenças estatisticamente significativas nas percentagens, exceção para o item fazer terapia com um profissional especializado. A percentagem dos adolescentes que consideram as estratégias mais úteis ou favoráveis para a depressão, comparativamente ao abuso de álcool, são o relaxamento (c2(1) = 551,12; p < 0,001), a meditação (c2(1) = 146,26; p < 0,001) e a procura de ajuda especializada em saúde mental (c2(1) = 400,00; p < 0,001). As estratégias como o exercício físico (c2(1) = 318,41; p < 0,001), a acupuntura (c2(1) = 14,06; p < 0,001), o levantar-se cedo todas as manhãs e ir apanhar sol (c2(1) = 373,86; p < 0,001), consultar um Website (c2(1) = 296,53; p < 0,001), ler um livro de autoajuda (c2(1) = 124,42; p < 0,001) e juntar-se a um grupo de apoio com o mesmo problema (c2(1) = 791,75; p < 0,001), são comparativamente consideradas mais úteis para o abuso de álcool.

Os valores dos coeficientes variam entre k = 0,26 (p < 0,001) e k = 0,50 (p < 0,001). Salientam-se os valores moderados dos coeficientes capa nas estratégias, praticar meditação (k = 0,40; p < 0,001), fazer acupunctura (k = 0,51; p < 0,001); Levantar-se cedo todas as manhãs (k = 0,42; p < 0,001); consultar um Website sobre o problema (k = 0,45; p < 0,001) e ler um livro de autoajuda (k = 0,48; p < 0,001).

Conhecimentos e competências para prestar a primeira ajuda e apoio aos outros

Relativamente a esta componente (Tabela 2), exceção para a estratégia sugerir procura de um profissional de saúde, todas as diferenças são estatisticamente significativas e mais vincadas nos itens: incentivá-la(o) a praticar exercício físico (c2(1) = 894,62; p < 0,001); ouvir os seus problemas de forma compreensiva (c2(1) = 146,47; p < 0,001); reunir o grupo de amigos para a/o animar (c2(1) = 135,77; p < 0,001) e ainda, não valorizar o seu problema (c2(1) = 53,85; p < 0,001). Os valores das medidas de concordância variam entre baixos k = 0,26(p < 0,001) e moderados k = 0,51(p < 0,001). A proporção de acordos específicos é mais elevada nos itens ouvir os seus problemas de forma compreensiva (0,95) e sugerir procura de um profissional de saúde (0,84).

Conhecimentos acerca do modo de prevenção das perturbações mentais

A última componente da LSM diz respeito aos conhecimentos acerca do modo como se podem prevenir as doenças mentais (Tabela 2). Ainda que existam diferenças estatísticas (p < 0,001) com significado na perceção de cada estratégia, nomeadamente a prática de exercício físico (c2(1) = 156,05; p < 0,001), o evitar de situações geradoras de stress (c2(1)= 163,23; p<0,001), o contato regular com amigos (c2(1) = 384,41; p < 0,001) ou, por exemplo, a não utilização de bebidas alcoólicas (c2(1) = 296,32; p < 0,001), os adolescentes e jovens atribuem importância a cada uma das estratégias. Apenas uma margem, 17,5% no caso da depressão e 20,5% no abuso de álcool, considera importante manter uma crença religiosa.

A análise da concordância revela valores que variam entre k = 0,33 (p < 0,001) para o contacto regular com amigos e k = 0,59(p < 0,001) para o item relativo a manutenção de uma crença religiosa. Cinquenta por cento dos valores observados nos coeficientes mostra concordância moderadas (k ³ 0,40), sendo que as proporções de acordos específicos mostram, no seguimento dos coeficientes, uma tendência para que os jovens concordem nas estratégias para ambas as perturbações.

 

 

 

TABELA 2

Distribuição Percentual das Respostas Assinaladas como “Úteis” em Cada Item das Componentes: Estratégias/intervenções de Autoajuda; Conhecimentos para prestar apoio e 1.ª Ajuda e Prevenção das Perturbações Mentais (N = 4938)

 

 

 

Vinhetas

c2(a)

K(b;c)

 

 

Depressão

Abuso de álcool

 

 

Estratégias/intervenções de auto ajuda

Fazer exercício físico

Praticar treino de relaxamento

Praticar meditação

Fazer acupunctura

Levantar-se cedo todas as manhãs…

Fazer terapia com um profissional…

Consultar um Website…

Ler um livro de autoajuda

Juntar-se a um grupo de apoio

Procurar ajuda especializada

Utilizar bebidas alcoólicas

Fumar para relaxar

 

66,2

82,9

62,7

23,4

27,6

74,8

45,9

48,3

49,9

59,3

2,8

4,0

 

79,4

64,7

53,3

25,6

41,9

73,6

58,9

56,4

73,3

42,0

3,5

4,6

 

318,41***

551,12***

146,26***

14,06***

373,86***

2,93ns

296,53***

124,42***

791,75***

400,00***

5,12*

3,81*

 

0,33*** (0,82)

0,26*** (0,80)

0,40*** (0,75)

0,51*** (0,63)

0,42*** (0,61)

0,37*** (0,84)

0,45*** (0,73)

0,48*** (0,75)

0,32*** (0,72)

0,28*** (0,64)

0,33* (0,36)

0,50*** (0,52)

 

 

Conhecimentos para prestar apoio e 1.ª ajuda

Ouvir os seus problemas

Dizer-lhe com firmeza para andar para a frente

Sugerir procura de um

Marcar uma consulta

Perguntar se tem tendências suicidas

Sugerir que beba uns copos

Reunir o grupo de amigos

Não valorizar o seu problema

Mantê-lo ocupado para que não pense…

Incentivá-lo a praticar exercício físico

 

95,2

48,6

77,2

60,8

16,6

3,6

73,8

3,1

62,7

48,5

 

90,1

52,3

76,2

63,5

14,8

4,5

64,8

5,7

65,9

74,7

 

146,47***

26,35***

1,87ns

11,01**

6,61**

6,35*

135,77***

53,85***

18,44***

894,62***

 

0,35*** (0,95)

0,48*** (0,74)

0,33*** (0,84)

0,38*** (0,77)

0,51*** (0,58)

0,28*** (0,31)

0,32*** (0,79)

0,26*** (0,29)

0,41*** (0,79)

0,26*** (0,69)

 

 

Como prevenir as perturbações mentais

Praticassem exercício físico

Evitassem situações geradoras de stresse

Mantivessem o contacto regular com amigos

Mantivessem o contacto regular com a família

Não utilizassem drogas

Não bebessem bebidas alcoólicas

Praticassem atividades relaxantes regularmente

Tivessem uma crença religiosa ou espiritual

 

64,0

83,6

85,6

86,2

82,0

74,3

72,0

17,5

 

73,0

75,3

72,2

80,9

82,4

85,6

65,6

20,5

 

156,05***

163,23***

384,81***

82,59***

0,56ns

296,32***

76,72***

33,83***

 

0,41*** (0,81)

0,36*** (0,87)

0,33*** (0,86)

0,41*** (0,90)

0,50*** (0,91)

0,35*** (0,87)

0,40*** (0,81)

0,59*** (0,67)

 

 

Nota. *p < 0,05; **p < 0,01; *p < 0,01; ns = não significativo. (a) Estatística qui-quadrado do teste de McNemar; (b) Medida de concordância k de Cohen. (c) Entre parêntesis: proporção de acordos específicos positivos.

 

 

 

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DISCUSSÃO

Os resultados obtidos neste estudo mostram que os adolescentes e jovens têm uma visão distinta da depressão e do abuso de álcool e este dado pode ser considerado positivo, já que são problemas cuja natureza e cursos são diferentes e que acarretam manifestações e consequências diversas na vida dos indivíduos.

No reconhecimento dos problemas, componente que é tida como um pré-requisito à procura de ajuda em saúde mental (Jorm, 2012, 2014), seja por decisão do próprio, seja ainda por sugestão daqueles que o rodeiam, e atendendo aos rótulos assinalados para ambos os problemas descritos nas vinhetas, os resultados indiciam uma utilização diferenciada dos rótulos, com valorização dos sinais e sintomas descritos. Uma margem substancial de participantes é capaz de usar rótulos adequados às situações, tanto para a depressão, incluindo outros rótulos que se ajustam tais como “stresse”, “problemas emocionais, psicológicos, mentais”, como para o abuso de álcool (p. ex., “abuso de substância”).

É de salientar que a utilização de rótulos adequados não pretende avaliar a capacidade de “diagnóstico” dos participantes, mas sobretudo a capacidade de problematizar a situação e atribuir-lhe um nome que se adeque e permita a aproximação à pessoa que está em sofrimento. Contudo, no caso da vinheta referente à depressão recorrem ao rótulo “esgotamento nervoso”, que sendo inespecífico serve para caraterizar toda e qualquer alteração da saúde mental e ainda aos rótulos “anorexia”, hipervalorizando a falta de apetite e a perda de peso descritas na vinheta, e “crise da idade”, que serve muitas vezes para avaliar o problema como “qualquer coisa” que é transitória, não é grave e que se espera que passe com o tempo (Loureiro, 2013; Loureiro, Sequeira, Rosa, & Gomes, 2014). Esta mesma avaliação como “crise da idade” é extensível, em maior percentagem, à vinheta do abuso de álcool.

No caso do abuso de álcool, os dados surpreendem, pois, sendo comum o consumo de álcool em termos recreativos nos adolescentes e jovens, é ainda assim preocupante que os mesmos avaliem os seus pares como “alcoólicos”, a ver pela percentagem que considera o problema como “alcoolismo”, mesmo que não o veja como uma doença mental. Provavelmente quererão indicar que a situação descrita é grave e que carece de intervenção (Loureiro, 2014; Loureiro et al., 2013).

Neste sentido, são de valorizar os resultados obtidos nesta componente, pois a evidência mostra que, por um lado, e caso não exista intervenção, os sintomas tendem a agravar-se ao ponto de poder comprometer o desenvolvimento e bem-estar dos indivíduos. Por outro, o tempo que medeia a ocorrência dos primeiros sinais e sintomas e o pedido de ajuda pode demorar mais de uma década e, neste sentido, a não valorização, a indiferença e mesmo banalização por parte de familiares, amigos e, inclusive, de professores e outros profissionais, pode contribuir também para um agravamento dos problemas (Loureiro, 2014).

Em termos de conhecimentos acerca da ajuda profissional e tratamentos disponíveis, os participantes valorizam como úteis, quer a ajuda dos profissionais de saúde tais como o “médico”, “psicólogo”, “psiquiatra” e inclusive o “enfermeiro”, quer ainda no mesmo patamar a ajuda informal como são os “familiares” e “amigos”, que não se distingue nas perturbações. Não deveremos esquecer que grande parte das pessoas que procuram e pedem ajuda em saúde mental, fazem-no por sugestão de alguém chegado, normalmente familiares ou amigos, o que vem na linha de outros estudos (Jorm, 2014).

Comparativamente, os assistentes sociais e os professores são percecionados como úteis por uma margem bem mais reduzida em ambos os casos. A nosso ver, essa perceção pode advir do papel do assistente social, cuja intervenção não se coloca muitas vezes no domínio da prevenção dos problemas de saúde mental, mas que centram mais a sua atuação na sinalização dos comportamentos e acionar das respostas sociais, e os adolescentes e jovens sabem-no. No caso dos professores, é possível que os participantes não se queiram expor, por medo e vergonha relacionada com confidencialidade e anonimato, ou ainda que considerem que a partilha do problema possa ter implicações no aproveitamento escolar (Rickwood et al., 2005).

Em termos de medicamentos e produtos, a diferença estatística observada revela, para o caso dos produtos de venda livre como vitaminas e chás, que os adolescentes comungam das representações sociais destes produtos e, sobretudo, assimilam muito do marketing e publicidade, já que estes produtos são apresentados indiscriminadamente como “solução” para quase todos os problemas de saúde mental, com ênfase para a depressão. O que dai poderá advir é, desde logo, pelo facto de serem de venda livre, a não procura e contacto com o profissional de saúde. Ainda assim, é salutar que cerca de 2/5 considerem úteis os antidepressivos na vinheta depressão, já que na maioria das vezes estes produtos são percecionados em termos negativos como tendo efeitos secundários acentuados (efeito zombie), aumento de peso e dependência ou, ainda, como não resolvendo os problemas. Mesmo assim, verifica-se que a perceção da utilidade dos produtos e medicamentos diminui comparativamente na vinheta do abuso de álcool, o que pode estar relacionado com a própria conceção do alcoolismo e, inclusive, da depressão, enquanto doenças mentais que os participantes têm. Quando a depressão é percecionada por uma margem substancial da população como uma questão de “fraqueza de carácter” ou “incapacidade para levar a vida para a frente” e o alcoolismo como um vício que assenta na vontade do indivíduo em continuar a beber ou parar o consumo, dificilmente os psicofármacos podem ser percecionados como eficazes.

Ao nível dos conhecimentos acerca da eficácia das estratégias de autoajuda, os resultados merecem-nos desde logo um reparo. Não sabemos se os adolescentes e jovens as utilizariam numa situação semelhante, mas sabemos que uma percentagem assinalável as considera úteis para ambas as perturbações, ainda que diferenciando-as na generalidade. Este conhecimento pode advir da informação que resulta das ações de sensibilização e de promoção da saúde realizadas nas escolas ou, ainda, da visibilidade social que é dada a estes problemas.

Não deixam de ser assinaláveis dois factos que emergem da leitura dos resultados. Desde logo, os participantes sabem que o consumo de álcool (inclusive continuado) e o consumo de tabaco são prejudiciais e agravam os problemas. Depois, a perceção de utilidade das estratégias de autoajuda é diferenciada para cada um dos problemas de saúde mental. No caso da depressão, são comparativamente mais valorizadas o relaxamento, a meditação e a procura de ajuda especializada, enquanto no álcool uma preferência em termos de utilidade pelo exercício físico, os passeios matinais, a consulta de informação, um livro de autoajuda e, ainda, a procura de um grupo de apoio de pessoas com problemas idênticos. Genericamente, estes resultados podem advir das diferentes conceções destes problemas de saúde mental.

Em termos de conhecimentos e competências para prestar a primeira ajuda e apoio aos outros, os resultados deste estudo são idênticos aos encontrados noutros estudos. Ainda que se observe uma diferenciação estatística em 9 dos 10 itens, essa diferença é resultado mais do tamanho amostral do que propriamente de uma visão muito distinta dos problemas. Assim, podemos observar que os participantes elegem para ambos os problemas a escuta atenta e compreensiva como a atitude de maior utilidade e a sugestão de procura e acompanhamento de ajuda profissional. Do mesmo modo, o consumo de álcool não é visto como útil.

Se estes resultados, por si só, são muito positivos, em linha com aquilo que é defendido e protagonizado pela primeira ajuda em saúde mental (Jorm, 2014; Loureiro, 2014), os resultados obtidos em alguns itens merecem-nos uma leitura atenta e crítica, já que os participantes parecem comungar muitas das representações socialmente construídas que desvalorizam estes problemas e tendem a adiar a procura de ajuda, tendo como consequência o agravamento dos sintomas. Dizer para “andar para a frente com firmeza” é uma estratégia que assenta muitas vezes na crítica à pessoa, não sendo por isso benéfica, mas contraproducente, pois leva ao isolamento e não partilha dos problemas. Do mesmo modo, procurar manter a pessoa ocupada para que não pense nos seus problemas, tentando a distração e esquecimento momentâneos, é uma estratégia transitória que não favorece a procura de ajuda.

É de salientar que no quotidiano é muito utilizada a expressão “tens de levar a vida em frente”, esquecendo os interlocutores que a grande maioria das pessoas que sofre de um problema de saúde mental, se conseguisse enfrentar o quotidiano por si, não necessitava deste tipo de “conselho” nem que lho lembrassem (Loureiro, 2014).

Do mesmo modo perguntar à pessoa se tem ideias suicidas não é visto como útil, isto porque se pensa, erradamente, que o questionar pode ativar os pensamentos suicidas, quando a evidência mostra o contrário (Jorm, 2012).

A enfase atribuída à sugestão da prática de exercício físico no caso de abuso de álcool está também patente na componente anterior. Por si só, a sugestão da prática de exercício físico não é prejudicial, contudo deve ser sugerida e supervisionada por um profissional de saúde.

A última componente, conhecimentos acerca do modo de prevenção das perturbações mentais, mostra desde logo um resultado satisfatório. Os adolescentes e jovens parecem saber que é possível prevenir as doenças mentais em ambos os problemas relatados. Este resultado é tão mais importante quando se sabe da necessidade de intervir precocemente em contexto escolar. A ênfase atribuída ao estabelecimento de relações conducentes a uma boa rede de suporte social, a não utilização de álcool e outras substâncias, assim como a prática de atividades prazerosas como o exercício ou relaxamento estão indicadas como estratégias seguras e promotoras da boa saúde mental.

O evitar de situações geradoras de stress é também saudável, sobretudo se não implicar um incremento da ansiedade. A religião que é tida muitas vezes apresentado como um fator protetor da saúde mental é percecionada como útil por, aproximadamente, 1/5 dos participantes. Este resultado pode decorrer de múltiplos fatores, desde logo o reduzido envolvimento dos adolescentes e jovens com a prática religiosa, ainda que possam professar uma crença, ou então uma clara incapacidade de valorar na religião o espaço que esta pode ter em termos de saúde e bem-estar.

Em termos globais os resultados deste estudo comparativo revelam um agregado de dados que nos permite concluir que os níveis de literacia são, quer na depressão, quer no abuso de álcool, muito modestos em praticamente todas as componentes e que representam duas formas diferenciadas de ver e encarar ambos os problemas e que podem decorrer de diferentes conhecimentos, crenças, experiências e inclusive familiaridade com os problemas relatados.

Limitações

Este estudo comporta algumas limitações. Por um lado, o facto do instrumento de colheita de dados (QuaLiSMental) indicar intenções comportamentais. Não temos garantia de que os adolescentes e jovens adotarão os comportamentos e atitudes que assinalaram no questionário. Por outro, os cenários hipotéticos / vinhetas podem ser diferentes em situações da vida real e os problemas de saúde mental pode ter diferentes sinais e manifestações no quotidiano.

Salienta-se também que as análises estatísticas comparativas das componentes da LSM são baseadas apenas em respostas “sim” e “útil”, e, por isso, necessitamos de repensar também as respostas “não sei”, pois é manifesta necessidade de ações de sensibilização nestes domínios.

Conclusão

Este estudo mostra uma matriz de resultados que permite concluir que os níveis de literacia são muito modestos em todas as componentes da LSM, representando duas maneiras distintas de ver os problemas, o que é positivo, pois são problemas diferenciados. Esta visão diferenciada e modo de encarar ambos os problemas poderá resultar de diferentes experiências, conhecimentos, crenças, e inclusive, grau de familiaridade com os problemas relatados.

Contudo, não deveremos esquecer-nos duas evidências que contribuem para a necessidade de agir nesta área da literacia em saúde mental, relativamente ao consumo de álcool e depressão. Por um lado, o facto da dependência de álcool ser um dos transtornos mentais mais graves e de maior prevalência, e neste sentido, o facto das primeiras experiências de consumo de álcool ocorrer durante a adolescência deve sugerir a necessidade de atuar em termos de prevenção. Por outro, a ocorrência de episódios depressivos é comum nos adolescentes e jovens. Este dado é mais preocupante quando sabemos que 50% das pessoas com doença mental diagnosticada (incluindo doentes com depressão) tiveram os primeiros episódios antes dos 18 anos, tornando-se também aqui necessário intervir em termos de promoção dos comportamentos de procura de ajuda e consequente primeira ajuda em saúde mental.

Estes resultados devem servir também para privilegiar estratégias de formação para professores que deverão ser vistos como parceiros-chave na prevenção e identificação de situações problemas, podendo, pois, potenciar a intervenção precoce nos problemas de saúde mental dos adolescentes e jovens.

 

Conflito de interesses: nenhum.

Fontes de financiamento: nenhuma.

 

 

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PhD. Elaboração do artigo, incluindo a análise estatística. Escola Superior de Enfermagem de Coimbra, Portugal.