2018, Vol. 4(2): 42-48
Autoconsciência
da aparência e a adaptação no ensino superior: Estudo exploratório
Artigo Original
José Mendes ⓘ ✉, Adriana Fraga ⓘ, Carla Medeiros
ⓘ, Daniela Moniz
ⓘ, Luana Miranda
ⓘ, Teresa
Medeiros ⓘ
https://doi.org/10.31211/rpics.2018.4.2.76
Recebido 4 abril 2018
Aceite 17 setembro 2018
Contexto: A Psicologia da Aparência tem merecido pouca atenção dos
investigadores portugueses. As representações contemporâneas do corpo ideal (magro, atlético e com formas),
muito avolumadas pelos meios de comunicação social e redes sociais, criam frequentemente
a insatisfação com a aparência. Estudos recentes referem que os estudantes
universitários se encontram insatisfeitos com a imagem corporal.
Objetivo: Avaliar
possíveis relações entre as preocupações com aparência, nomeadamente a
autoconsciência da aparência, e a adaptação ao Ensino Superior por parte de
estudantes portugueses.
Método: Exploratório e quantitativo. Participaram 206
estudantes do Ensino Superior, tendo respondido a um Questionário
Sociodemográfico, à versão portuguesa reduzida da Escala de Avaliação da
Aparência de Derriford (DAS-14) e ao Questionário de Adaptação ao Ensino
Superior (QAES).
Resultados: Verificaram-se
diferenças significativas na DAS-14 (autoconsciência da aparência) entre os
sexos; correlação moderada entre a DAS-14 e a dimensão adaptação
pessoal-emocional e relações fracas entre a DAS-14 e as restantes dimensões do
QAES (adaptação interpessoal, adaptação à instituição, adaptação académica,
compromisso com o curso e desenvolvimento de carreira). A autoconsciência da
aparência apresenta-se quer como variável preditora, quer como variável de
resposta na dimensão adaptação pessoal-emocional.
Conclusão: Existe
relação entre o sexo a autoconsciência da aparência. Os estudantes que têm
menor concentração nos sentimentos negativos no corpo têm uma maior relação com
as dimensões sociais, cognitivas e contextuais da adaptação ao ensino superior.
As preocupações com a aparência e a adaptação pessoal-emocional
influenciam-se mutuamente, isto é, a aceitação da aparência parece ser
relevante para a adaptação e para o desenvolvimento da identidade dos adultos
emergentes. O estudo abre futuras investigações na área da Psicologia da
Aparência.
Palavras chave:
Adultos emergentes · Adaptação Ensino Superior ·
Autoconsciência da Aparência · Estudo
exploratório
As representações do corpo têm sofrido
alterações ao longo da História. No decorrer do século XX, particularmente na
segunda metade da centúria, enaltece-se um ideal de corpo que se quer/deseja magro, atlético e com formas
definidas, e que se passa a constituir como um objeto de consumo perante a
oferta de produtos e serviços num mercado crescente (Rodrigues,
Teves, & Medeiros, 2013). A sociedade, muito através dos órgãos de
comunicação social, sobretudo a televisão, releva uma cultura que elege o corpo
como uma fonte de identidade; há a procura por uma figura “perfeita”, que
conduz ao afastamento do corpo real (Martins, Nunes, & Noronha, 2008). Este corpo
ideal está diretamente associado à imagem de poder, beleza e mobilidade social,
sendo crescente a insatisfação das pessoas com a própria aparência (Rodrigues et al., 2013).
As representações do corpo parecem fazer
parte integrante do processo de adaptação ao ensino superior. De facto, o
processo de adaptação ao ensino superior requer um conjunto de competências
adaptativas a um novo contexto, mobilizando tanto os recursos pessoais e
contextuais (desafios emocionais, académicos, sociais e institucionais), como o
desenvolvimento de novas estruturas de funcionamento interpessoal (Freitas,
Raposo, & Almeida, 2007; Vieira & Grantham, 2011). No entanto, os estudantes do
ensino superior, apesar de apresentarem experiências e vivências diversas,
apresentam características comuns (Souza
& Alvarenga, 2016),
onde a adaptação ao ensino superior é modulada, do ponto de vista psicossocial,
por fatores pessoais, académicos e sociais (Deaño,
Gil, Rodríguez, García-Señorán, & González, 2014). Estudos referem que a
maioria dos adultos emergentes que frequenta o ensino superior sente
insatisfação com a sua imagem corporal (e.g., Behmani & Kumar, 2016; Souza &
Alvarenga, 2016).
Verifica-se, assim, que as questões de identidade corporal e de (in)satisfação
com corpo, que estavam muito circunscritas à puberdade e à adolescência, foram
expandidas para a adultez emergente, período de desenvolvimento que caracteriza
os estudantes tradicionais do ensino superior (Arnett, 2004).
Para melhor compreensão sobre as
preocupações com a aparência, considera-se relevante diferenciar os conceitos
de Imagem Corporal, Insatisfação com a Imagem Corporal e Autoconsciência da Aparência. O conceito
de Imagem Corporal é
multidimensional, englobando perceções, crenças, pensamentos, sentimentos e
comportamentos relativos ao self físico (physical
self; MacKenzie, 2012). Não existindo uma
definição sobre uma imagem corporal negativa (Cash, 2002), a Insatisfação
com a Imagem Corporal revela-se um conceito mais amplo, constituído por
pensamentos e sentimentos negativos que o indivíduo tem sobre os aspetos não
visíveis do corpo, influenciado por um inúmero de variáveis biopsicossociais (Cash & Smolak, 2011; Latiff,
Muhamad, & Rahman, 2018; Smolak, 2012). Por último, a Autoconsciência da Aparência,
concentra-se nos sentimentos negativos em torno do aspeto do corpo (Moss
& Rosser, 2012),
isto é, como o indivíduo se sente e se comporta relativamente a algum aspeto
incomodativo da sua aparência (Carr, Moss, & Harris, 2005).
De acordo com Cash e Pruzinsky (2002), a imagem corporal tem um
efeito significativo sobre o que as pessoas sentem e pensam sobre si próprias,
fazendo com que comportamento do indivíduo e o relacionamento social se
influenciem. Uma imagem corporal negativa pode atingir o funcionamento social e
a qualidade de vida no quotidiano dos indivíduos (Rumsey
& Harcourt, 2012), podendo o impacto e aceitação das relações
interpessoais influenciar a construção da imagem corporal (Tiggemann, 2015). Nestes processos a sociedade
desempenha um papel importante na modelação do corpo através das relações
sociais e culturais (Lopes,
Mendes, & Sousa, 2017).
A
aparência tem uma importância representativa nos valores sociais, devendo
analisar-se a aparência, quer pela perspetiva exterior/sociedade, quer pela
perspetiva interior/indivíduo (Rumsey
& Harcourt, 2012).
Em face dos vários estudos já referidos que
apontam a tendência para: i) a insatisfação dos estudantes do ensino superior
em relação ao seu próprio corpo; ii) a aparência desempenhar um papel relevante
na interação social (Carr, Harris, & James, 2000) e iii) as comparações com a
aparência serem um fator sociocultural importante na perceção da imagem
corporal (Fardouly, Pinkus, & Vartanian, 2017), existe a necessidade de
maior investigação sobre a avaliação da autoconsciência da aparência em
contexto universitário (Medeiros et al., 2018).
Assim, contribuindo para este desiderato,
pretende-se com a presente investigação compreender as relações entre a
adaptação ao ensino superior e as preocupações que os estudantes universitários
– adultos emergentes – sentem em relação à sua aparência.
Procedimentos
Após
a apreciação dos instrumentos mais adequados para a medição das variáveis em
estudo, optou-se pelo uso de instrumentos já validados. Assim, depois da
explicitação do âmbito do estudo e dos objetivos, obteve-se a autorização dos
autores dos instrumentos abaixo referidos para a utilização neste estudo.
Posteriormente, selecionado o universo dos estudantes do ensino superior
português, procedeu-se à clarificação dos objetivos e às condições de
investigação e entregou-se o Termo de Consentimento Livre e Esclarecido que foi
preenchido por cada participante do estudo, dando assim a sua anuência,
garantidos que foram o anonimato e a confidencialidade individual. Para a
recolha de dados, procedeu-se à impressão dos instrumentos em formato papel para
aplicação presencial, tendo-se disponibilizado igualmente o estudo através de
uma plataforma digital (Google Forms), em que os participantes teriam de
ler o Termo de Consentimento Livre e Esclarecido, aceitando a participação na
presente investigação.
Participantes
Participaram
neste estudo, 206 adultos emergentes que frequentam o ensino superior,
distribuídos por 12 instituições, com a seguinte distribuição: distrito do
Porto (22,8%), Lisboa (18%), Coimbra (13,6%), Açores (11,2%) e Minho (10,7%),
Aveiro (9,2%), estando os restantes participantes distribuídos pelos concelhos
Guarda (3,4%), Algarve, Setúbal e Évora (2,9%), Viseu (1,5%) e Covilhã (1%). A
amostra foi constituída por 35 participantes do sexo masculino (17%) e 171 do
sexo feminino (83%; χ2 = 89,79;
p < 0,001) e com uma idade média de idades de 18,83 anos (DP =
1,33). A maioria dos estudantes frequentava o curso de licenciatura (97,1%),
sendo que 74,8% destes cursava o 1.º ano, 12,1% o 2.º ano e 10,2% o 3.º ano do
ensino superior. Relativamente às habilitações académicas dos pais dos
participantes, somente 28,6% das mães possuíam habilitações académicas a nível
superior, sendo esta percentagem inferior à dos pais dos participantes (16,6%).
Instrumentos
Para
a recolha de dados, foram aplicados três instrumentos. Para a caracterização da
amostra procedeu-se à construção e aplicação de um questionário
sociodemográfico no intuito de caracterizar os participantes sobre a idade,
sexo, estado civil, habilitações e profissão dos pais, curso e ano frequentado
e instituição de Ensino Superior frequentada.
Para
avaliar a adaptação ao ensino superior recorreu-se ao Questionário de
Adaptação ao Ensino Superior (QAES), construído e validado por Araújo e colaboradores (2014). Este instrumento é constituído por 68 itens de
autorresposta, tipo Likert com cinco opções de resposta (1 – Discordo
Totalmente, 2 – Discordo, 3 – Não discordo nem concordo; 4 – Concordo
e 5 – Concordo totalmente) e avalia seis dimensões independentes na
adaptação ao ensino superior com bons índices de consistência interna: adaptação
interpessoal (α de
Cronbach = 0,92), adaptação à instituição (α de Cronbach = 0,72),
adaptação académica (α de Cronbach = 0,83), compromisso com o curso (α de Cronbach = 0,92),
adaptação pessoal-emocional (α de Cronbach = 0,91) e desenvolvimento de
carreira (α de
Cronbach = 0,92).
Por
último, para avaliar a autoconsciência da aparência aplicou-se a versão
portuguesa reduzida da Escala de Avaliação de Derriford (DAS-14).
Trata-se de uma versão reduzida do instrumento validado para a população
portuguesa por Mendes e Pereira (2018), sendo constituído por um total de 14 itens,
enquadrados numa escala tipo Likert, às quais se acrescentam quatro questões
adicionais em torno da existência de algum aspeto/característica da aparência
que gere preocupação: uma questão relativa ao aspeto sensível da aparência; uma
questão que aborda o indivíduo não gosta na aparência e duas questões que focam
outras características que influenciam a preocupação na aparência. Os 14 itens
têm o objetivo de avaliar a forma como o indivíduo se sente e se comporta
relativamente ao aspeto que o incomoda, sendo cotados através de dois conjuntos
de resposta com cinco opções (1 – Nada,
2 – Ligeiramente, 3 – Moderadamente, e 4 – Extremamente, ou de 0 – N/A (não aplicável); 1 – Nunca/Quase nunca, 2 – Às vezes, 3 – Frequentemente, e 4 – Quase Sempre), não apresentando itens
invertidos. A DAS-14 apresenta um bom índice de consistência interna (α de Cronbach = 0,91).
Análise Estatística
Para
o tratamento estatístico foi utilizado o software Statistical Package for
the Social Sciences (SPSS), versão 22 para macOS. A análise da consistência
interna dos instrumentos foi efetuada através do Alfa de Cronbach. Procedeu-se
à correlação de Pearson para analisar possíveis associações entre as
diversas variáveis, tendo-se prosseguido à comparação dos valores médios das
variáveis em estudo através do teste t-Student e respetivos tamanhos do
efeito (TDE). Por último, realizou-se uma análise de regressão linear múltipla
com a finalidade de analisar o conjunto de variáveis que melhor predizem a
adaptação ao ensino superior e a autoconsciência da aparência.
Determinou-se
a fiabilidade da escala QAES, obtendo-se um alfa de Cronbach de 0,91 para o
total dos itens e valores igualmente adequados para as dimensões (Adaptação
Interpessoal: α de
Cronbach = 0,87; Adaptação à Instituição: α de
Cronbach = 0,77; Adaptação Académica: α de
Cronbach = 0,83; dimensão Compromisso com o Curso: α de Cronbach = 0,94; Adaptação
Pessoal-Emocional: α de
Cronbach = 0,91; Desenvolvimento de Carreira: α de
Cronbach = 0,85). A DAS-14 apresentou uma fiabilidade elevada (α de Cronbach = 0,91).
Quanto à
homogeneidade dos instrumentos, o QAES apresenta um Kaiser-Meyer-Olkin (KMO) de 0,90 (χ2(9373,45); p ≤ 0,001) e a DAS-14 apresentou um KMO de 0,93 (χ2
(1345,31); p ≤ 0,001).
Verificaram-se
diferenças estatisticamente significativas na variável autoconsciência da
aparência em função do sexo (Tabela 1), sendo a média
superior no sexo feminino, com um TDE médio (g de Hedges = 0,57).
Quanto à
QAES, não se verificaram diferenças significativas quer para o total quer para
as dimensões (p > 0,05)
apresentado um TDE considerado pequeno (g
de Hedges < 0,20).
|
TABELA 1 Diferenças
da Autoconsciência da Aparência (Escala de Avaliação de Derriford) Entre os
Dois Sexos (N = 206) |
|
||||||||
|
Variáveis |
Sexos
|
N
|
M |
DP
|
t |
p
|
95% IC |
|
|
|
Inferior |
Superior
|
|
|||||||
|
Autoconsciência da aparência |
Masculino |
35 |
18,46 |
8,14 |
-3,05 |
< 0,001 |
-9,23 |
-1,98 |
|
|
Feminino |
171 |
24,06 |
10,23 |
|
|||||
|
Nota. N = número de sujeitos; M = Médias; DP = Desvios-padrão; t
= teste t de Student; p = valor de significância; IC = Intervalo de confiança. |
|
A Tabela 2 apresenta resultados que indicam uma
relação fraca, mas significativa entre a variável sexo e a Autoconsciência da
Aparência. Esta apresenta uma correlação moderada e significativa com a
dimensão Adaptação Pessoal-Emocional e uma relação negativa fraca, mas
significativa com as restantes dimensões (Adaptação Interpessoal, Adaptação à
Instituição, Adaptação Académica, Compromisso com o Curso e Desenvolvimento de
Carreira). Isto é, quanto menor Autoconsciência da Aparência maior a Adaptação
Interpessoal, Adaptação à Instituição, Adaptação Académica e Compromisso com o
Curso e Desenvolvimento de Carreira. Verificou-se,
igualmente, uma relação positiva entre a Adaptação Académica e o Compromisso
com o Curso (r = 0,51) e a Adaptação
à Instituição e o Compromisso com o Curso (r
= 0,41).
|
TABELA 2 Correlações
Bivariadas entre o Sexo, a Autoconsciência da Aparência (Escala de Avaliação de
Derriford – DAS-14) e as Dimensões do Questionário de Adaptação ao Ensino
Superior (QAES) (N = 206) |
|
||||||||
|
1 |
2 |
3 |
4 |
5
|
6
|
7
|
8
|
|
|
|
1.
Sexo |
— |
0,21** |
0,19 |
-0,05 |
0,05 |
0,01 |
0,10 |
0,02 |
|
|
2.
Autoconsciência da Aparência (DAS-14) |
— |
-0,18** |
-0,17* |
-0,19** |
-0,15* |
0,53** |
-0,14* |
|
|
|
3.
Adaptação Interpessoal (QAES) |
— |
0,35** |
0,25** |
0,39** |
-0,28** |
0,35** |
|
||
|
4.
Adaptação à Instituição (QAES) |
|
|
|
— |
0,37** |
0,41** |
-0,35** |
0,50** |
|
|
5.
Adaptação Académica (QAES) |
|
|
|
|
— |
0,51** |
-0,30** |
0,55** |
|
|
6.
Compromisso com o Curso (QAES) |
|
|
|
|
|
— |
-0,33** |
0,62** |
|
|
7.
Adaptação Pessoal e Emocional (QAES) |
|
|
|
|
|
|
— |
-0,33 |
|
|
8.
Desenvolvimento de Carreira (QAES) |
|
|
|
|
|
|
|
— |
|
|
M |
1,83 |
23,11 |
3,75 |
3,75 |
3,41 |
3,83 |
3,16 |
3,16 |
|
|
DP |
0,38 |
10,11 |
0,66 |
0,64 |
0,69 |
0,78 |
0,91 |
0,76 |
|
|
Nota. *p < 0,05; ** p < 0,01. |
|
O modelo de regressão linear múltipla da Autoconsciência da
Aparência em função das dimensões da adaptação ao ensino superior, revelou-se
estatisticamente significativo (F(6,199)
= 13,50; R2 = 0,30; p ≤ 0,001), tendo-se revelado a dimensão
Adaptação Pessoal-Emocional como preditora da Autoconsciência da Aparência (β =
0,53; t(199) = 8,01; p ≤ 0,001).
Noutro sentido, analisarem-se as dimensões da adaptação ao ensino
superior, em função da variável Autoconsciência da Aparência, o modelo
revelou-se estatisticamente significativo em todas as dimensões do QAES (Tabela 3), observando-se maior variabilidade entre a variável
Autoconsciência da Aparência e Adaptação pessoal-emocional (27,8%).
|
TABELA 3 Regressão
Linear Múltipla Utilizando a Variável Autoconsciência da Aparência Para
Predizer As Dimensões do Questionário de Adaptação ao Ensino Superior (QAES)
(N = 206) |
|
||||||
|
|
Autoconsciência da Aparência |
|
|||||
|
Dimensões do
QAES |
B |
β |
t |
p |
F(gl) |
R2 |
|
|
Adaptação
interpessoal |
-0,012 |
-0,184 |
-2,67 |
0,008 |
7,12(204) |
0,029 |
|
|
Adaptação
à instituição |
-0,011 |
-0,172 |
-2,49 |
0,014 |
6,18(204) |
0,025 |
|
|
Adaptação
académica |
-0,013 |
-0,185 |
-2,69 |
0,008 |
7,22(204) |
0,029 |
|
|
Compromisso
com o curso |
-0,011 |
-0,146 |
-2,103 |
0,037 |
4,43(204) |
0,016 |
|
|
Adaptação
pessoal-emocional |
0,048 |
0,53 |
8,93 |
< 0,001 |
79,87(204) |
0,278 |
|
|
Desenvolvimento
de carreira |
-0,010 |
-0,139 |
-2,01 |
0,046 |
4,02(204) |
0,015 |
|
|
Nota. gl = graus de liberdade. |
|
Pretendeu-se com o presente estudo analisar possíveis
relações entre as preocupações com a aparência e a adaptação ao Ensino
Superior. Os resultados obtidos apontam para uma boa fiabilidade e
homogeneidade das variáveis, tendo-se obtido valores de alfa de Cronbach e
Kaiser-Meyer-Olkin considerados bons (Marôco, 2010). Apesar dos resultados apontarem para
diferenças estatisticamente significativas na Autoconsciência da Aparência
segundo o sexo dos estudantes, temos de ter em conta que a amostra é
significativamente maior no sexo feminino, apresentando diferenças
significativas na variável autoconsciência da aparência em relação ao sexo
masculino. Contudo, os resultados não verificaram diferenças significativas nas
dimensões do QAES, apresentando tamanhos do efeito considerados pequenos (Espírito-Santo & Daniel, 2015). Um estudo de Medeiros
et al. (2018) com estudantes universitários
verificou que o sexo feminino apresenta maiores níveis de preocupação com a
forma corporal. Estes resultados podem estar relacionados com o facto de as
mulheres compararem a aparência entre si, influenciando a sua imagem corporal (Fardouly et al., 2017), ou estarem mais preocupadas com a
sua adaptação interpessoal (Almeida, Guisande, Soares, & Saavedra, 2006).
Verificam-se fracas relações negativas, mas significativas
entre a Autoconsciência da Aparência e as dimensões de Adaptação à Ensino
Superior, à exceção da dimensão Adaptação Pessoal-Emocional que apresenta uma
correlação positiva moderada e também significativa. A dimensão Adaptação
Pessoal-Emocional revelou-se ainda como variável preditora da Autoconsciência
da Aparência. Na verdade, os resultados
parecem evidenciar uma tendência para que uma menor autoconsciência da
aparência (menos sentimentos negativos em torno do aspeto do corpo) se
relacione com uma maior centração nas questões de adaptação académica (curso,
instituição e carreira) e nas questões interpessoais, num desenvolvimento mais
positivo e construtivo. Estes resultados podem dever-se ao facto de os adultos
emergentes que ingressam no ensino superior estarem numa fase de transição,
numa nova etapa na construção de identidade e do desenvolvimento das relações
interpessoais, onde influenciam e são influenciados pelos grupos em que se
inserem (Almeida et al., 2006; Araújo,
Costa, Casanova, & Almeida, 2014; Araújo et
al., 2016; Costa, Araújo, Diniz, & Almeida, 2014; Nunes & Garcia, 2010), estando confortáveis com a sua
aparência (Tomás, Ferreira, Araújo, & Almeida, 2014).
Salienta-se que a construção da identidade social está
fortemente associada à perceção e funcionamento do corpo (Santos & Silva, 2017), existindo uma associação entre a
imagem e as representações relacionadas com o corpo (Moliner, 2016), influenciando as dificuldades de
relacionamento interpessoal quando existe uma insatisfação com a imagem
corporal (Garcia, Macedo, & Nunes, 2013). Estudos indicam que a construção da
identidade pode estar associada aos primeiros dois anos de frequência do ensino
superior (Araújo et al., 2016; Costa et
al., 2014),
no entanto, não se verificaram diferenças estatisticamente ou correlação entre
o ano de frequência do ensino superior e a autoconsciência da aparência, uma
vez que a maioria dos estudantes se encontrava a frequentar o primeiro ano do
Ensino Superior.
O nosso estudo apresenta limitações que devem ser realçadas, incluindo o facto
de a amostra apresentar uma desproporção quanto aos sexos e não se ter
explorado a altura e o peso dos participantes de forma a explorar possíveis
relações entre o índice de massa corporal e autoconsciência da aparência.
No entanto, os instrumentos apresentam bons índices de fiabilidade e
homogeneidade e a amostra apresentou uma dimensão adequada para as análises
estatísticas efetuadas. Em síntese, o sexo feminino apresenta maior preocupação
com a aparência em relação ao sexo masculino. Verificou-se uma fraca relação
entre a autoconsciência da aparência (sentimentos negativos em torno do aspeto
do corpo) e as dimensões da adaptação ao ensino superior, podendo inferir-se
que os estudantes que não tem tendência à desvalorização da sua aparência
concentram-se mais nas dimensões sociais, cognitivas e contextuais da adaptação
ao ensino superior. A autoconsciência da aparência apresenta-se neste estudo
como possível variável preditora das dimensões da adaptação ao ensino superior.
A presente investigação permite concluir que as preocupações com a
aparência e a adaptação pessoal-emocional se influenciam mutuamente, isto é, a
aceitação da aparência parece ser relevante para a adaptação e para o bom
desenvolvimento da identidade dos estudantes do ensino superior.
Sendo desconhecidos estudos que analisem as preocupações com a aparência
como variável preditora, consideramos a contribuição desta investigação como
pioneira no estudo sobre a autoconsciência da aparência, recomendando-se mais
investigações nesta área da Psicologia da Aparência e nas suas relações com o
desenvolvimento positivo e a saúde.
Conflito de interesses: Nenhum.
Fontes de financiamento: Nenhuma.
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ⓘ PhD. Contribuiu para a supervisão do
estudo, revisão de literatura, análise estatística e para a redação e revisão
do manuscrito. INTELECTO – Psicologia & Investigação, Ponta Delgada,
Açores, Portugal.
ⓘ Estudante Psy. Contribuiu para a recolha de dados e para a revisão de
literatura. Universidade dos Açores, Ponta Delgada, Açores, Portugal.
ⓘ Estudante Psy. Contribuiu para a recolha de dados, revisão de literatura
e para a redação do manuscrito. Universidade dos Açores, Ponta Delgada, Açores,
Portugal.
ⓘ Estudante Psy. Contribuiu para a recolha de dados, revisão de literatura
e para a redação do manuscrito. Universidade dos Açores, Ponta Delgada, Açores,
Portugal.
ⓘ Estudante Psy. Contribuiu para a recolha de dados, revisão de literatura
e para a redação do manuscrito. Universidade dos Açores, Ponta Delgada, Açores,
Portugal.
ⓘ PhD. Coordenadora do estudo. Contribuiu para a redação e revisão
integral do artigo. Universidade dos Açores, Ponta Delgada, Açores, Portugal.
Instituto de Psicologia Cognitiva, Desenvolvimento Social e Humano da Faculdade
de Psicologia da Universidade de Coimbra, Portugal.